Cipriano Luckesi
INTRODUÇÃO
Nos textos que postei
recentemente aqui no facebook, como também no blog que mantenho na rede, tenho
sinalizado a importância da articulação funcional entre os três segmentos
funcionais do cérebro humano, tomando por base a teoria do cérebro trino,
elaborada por Paul MacLean. Quando cada um dos segmentos evolutivos do nosso
sistema nervoso atua por si mesmo, em separado, ele produz algum resultado,
contudo ele não se apresenta nem como o melhor nem como o mais rico dos
resultados, caso que ocorreria se os três segmentos atuassem articuladamente.
Então, a aprendizagem será
o recurso que poderá auxiliar-nos no uso mais rico dos três segmentos funcionais
do cérebro de modo articulado e harmônico, possibilitando, ao mesmo tempo,
compreender, teorizar e projetar o que fazer (neocortex), com tonalidades
afetivas que conduzem a ação para a frente e com vitalidade para o movimento. Com
os três segmentos atuando conjuntamente, temos uma ação plena do ser humano,
entendimento, sentimento e ação.
Essa compreensão do
funcionamento harmônico dos três segmentos cerebrais nos remete fenômeno das
três camadas embrionárias do ser humano: endoderma, mesoderma e ectoderma.
O endoderma, no processo
formativo no decorrer do percurso da gravidez --- passando do embrião ao bebê,
com a mediação do estágio do feto ---, forma nossas vísceras, que David
Boadella (nota 01) sinaliza ser a sede de nossos sentimentos. O mesoderma é
responsável pela formação do nosso esqueleto e nossas massas musculares;
recursos de nossa sustentação e de nossos movimentos. E, por último, ectoderma,
responsável pela formação do nosso sistema nervoso, incluindo a capacidade de
pensar, refletir e projetar.
Pensar (ectoderma),
sentir (endoderma) e agir (mesoderma) são componentes fundamentais da vida
humana. Sem pensar, nosso modo de viver não teria significado e direção; sem
sentir, nosso agir --- seja ele qual for --- será sem sabor; sem o movimento,
nosso agir não existiria, desde que ele depende de forças tendo em vista
garantir a ação.
Hoje, adultos,
necessitamos do funcionamento harmônico dessas três camadas embrionárias do ser
humano, que correspondem aos três segmentos funcionais do nosso sistema nervoso
--- reptiliano (movimento) límbico (sentimentos e emoções), neocortex
(pensamento, razão).
Quando não estão
harmônicos, tanto os segmentos funcionais do cérebro, como as camadas
embrionárias constitutivas do ser humano, cada um por si atua, quebrando a
harmonia. O pensamento vai para um lado, o sentimento para outro e o agir
(coitado!) endoidece. Ou seja, nada de harmonia.
Qual o caminho para criar
a harmonia entre os segmentos funcionais do cérebro, assim como entre as três
camadas embrionárias que deram forma ao nosso corpo, assim como ao nosso modo
de ser e de viver? A meu ver, a aprendizagem. Afinal, somos e agimos como
aprendemos a ser e a agir.
A aprendizagem pode
decorrer das exigências do meio ambiente, a ação educativa de nossos pais,
parentes, vizinhos, padres, pastores, professores, professoras, agentes
comunitários... Entre todos os agentes do ensino, nós, educadores escolares,
temos uma responsabilidade a mais: somos contratados e destinados profissionalmente
a ensinar. Esse é o nosso papel.
Então, desejo sinalizar
alguns cuidados necessários nos atos de ensinar, que conduzem ao aprender.
Aprender significa “tomar
posse conceitualmente da realidade”, isto é, compreender o que é determinada
realidade, como ela funciona, qual a sua qualidade, como é possível atuar com
ela.
A investigação esclarece
a realidade (traz luz, traz o “claro” sobre ela); a aprendizagem se apossa da
compreensão da realidade, que emerge do esclarecimento. Ensinar significa que
alguém, tendo a posse da compreensão da realidade, possibilita que o outro
também tenha a posse do mesmo esclarecimento.
Portanto, para que alguém
ensine, importa que ele tenha a posse do conteúdo que ele ensina. Não há como
alguém ensinar o outro, se não tem a posse do conhecimento que deseja ensinar,
seja esse conhecimento teórico ou prático. Existe um ditado popular que diz que
“ninguém dá o que não tem”.
PASSOS
NO ENSINAR-APRENDER
Então, como se dá o
algoritmo do ensino-aprendizagem? É um caminhar que vai da ação predominante de
quem ensina para a ação predominante de quem aprende. No início, há o
predomínio de quem ensina, e, no final, o predomínio de quem aprende. Nos atos
de ensinar-aprender, ocorre um trânsito do predomínio de quem ensina para o de quem
aprende (nota 01).
Ensina quem transmite um
conhecimento. Então, ensina o professor na sala de aula, cuja mediação é sua
fala e sua orientação; ensina o autor de um livro, que partilha seu
conhecimento através de uma comunicação escrita e impressa; ensina o autor de
um dicionário, de uma matéria de jornal.... Afinal, o ensino pode ocorrer
através de muitas mediações. Em síntese, ensina quem já detém a posse de um
conhecimento e o transmite a alguém que vai aprender.
Todavia, importa
esclarecer, que o ensino, na sala de aula, tem uma nuance que as outras formas
de ensino, acima citadas, não têm --- a orientação para aprender. Na sala de
aula, o professor não só transmite o conhecimento (seja através de sua fala,
seja através da proposição de uma leitura, de um estudo, a assistência de um
documentário...), mas, ao mesmo tempo, está presente e atuante, para que, o
estudante se aproprie compreensiva e praticamente do que está transmitindo.
I - O PRIMEIRO PASSO NO ATO DE ENSINAR-APRENDER É A EXPOSIÇÃO DO CONTEÚDO A
SER APRENDIDO.
O ato de ensinar de
inicia pela exposição. Expor significa “colocar diante de...”; expressão que
tem sua origem no verbo latino “exponere” (que significa “colocar diante
de...”).
Todavia, importa estar
ciente de que “expor” não significa “ensinar”. Exposição nada mais significa que
exposição, isto é “colocar alguma coisa diante de alguém”.
Nesse passo do ato de
ensinar-aprender, o educador tem o papel predominante: ele traz o conteúdo e o
expõe, seja por que meio de comunicação for; o meio mais comum na escola é sua
fala e sua orientação de e para o estudo; ele conduz a apresentação do tema.
Ele coloca diante do estudante o conteúdo a ser aprendido. Esse “colocar o
conteúdo diante do estudante” poderá ser realizado também pela orientação de
uma leitura, pela assistência de um documentário, de um filme, pela consulta a
uma enciclopédia, entre outros meios. Evidentemente que essa exposição deve se
processar de forma didática, isto é, de forma facilitada à compreensão e a
assimilação do conteúdo exposto, a fim de que o estudante possa acompanhar os
passos da apresentação do conteúdo.
II
– O SEGUNDO PASSO É A ASSIMILAÇÃO DO CONTEÚDO EXPOSTO
Esse é o segundo passo do
ato de ensinar-aprender, que poderá ocorrer de forma articulada e simultânea
com o primeiro passo, ou seja, enquanto se expõe um determinado conteúdo,
simultaneamente, se auxilia o educando a compreender o que está sendo exposto.
Essa arte dependerá de cada educador, assim como do meio de comunicação que
está utilizando para proceder a assimilação do conteúdo. Em todo caso, importa
estar ciente de que a exposição de um conteúdo exposto e não assimilado, do
ponto de vista do ensino, é uma inutilidade.
O termo “assimilar”
significa “tornar igual a si”; o termo “assimilar” vem do latim “a-simile”, que
equivale a “tornar semelhante a si”. Quando se fala em “assimilar um alimento”
entende-se que “o alimento se tornou igual ao sujeito que dele se alimentou” (o
alimento ingerido tornou-se plasma, assim como outros componentes vitais do
corpo de que o assimila). Assimilar um conteúdo significa torná-lo semelhante a
si mesmo, para seu próprio uso; n o caso do ensinar-aprender, assimilar um
conteúdo significa torná-lo próprio, através dos próprios recursos de
entendimento e de linguagem.
No cotidiano, quando
alguém está nos explicando alguma coisa, dizemos: “ Espera um pouco; deixa ver
se entendi bem o que você está falando”; então, repetimos o que o outro
comunicou com nosso entendimento e nossa linguagem; e, nosso interlocutor nos
dirá, “Correto, é isso mesmo” ou nos dirá “Você ainda não compreendeu bem o que
lhe expus, vou expor de novo”; e, então, nesse caso, nos exporá de novo sua
compreensão, criando condições para que assimilemos aquilo que está a nos dizer.
Jean Piaget denominava
esse processo de “assimilação-acomodação”, o que desejava dizer que, à medida
em que um sujeito assimila um conteúdo (= tornado igual si), acomoda-se à uma
nova experiência (= a conduta aprendida). Sai do estágio de entendimento em que
se encontra e acomoda-se num novo patamar.
Aliás, esse é verdadeiro
significado do termo “didática”, cuja origem etimológica vem do verbo grego
“didasko”, que significar ensinar, isto é, “facilitar a apropriação de um
determinado conhecimento”, ou esclarecimento da realidade.
Muitos poemas gregos
foram caracterizados como “didáticos” devido terem por finalidade facilitar a
aprendizagem dos seus respectivos conteúdos. Os poemas da “Odisseia” e da “Ilíada”,
da autoria do Homero, tinham por objetivo facilitar a apropriação dos
acontecimentos fundamentais da mítica história grega; e, dessa forma, deveriam,
como cânticos didáticos, ensinar ao povo grego o seu caminhar pelo tempo e a
sua glória.
Nesse passo do processo
de ensinar e aprender, existe uma dança entre ensinante e aprendente, um
diálogo, de tal forma que o aprendente se apropria daquilo que o ensinante
expõe. Não basta só a exposição, mas sim a interlocução entre quem ensina e
quem aprende.
Nesta situação, o centro
de força de atuação dos personagens no processo de ensinar-aprender deixa de
ser exclusivamente de quem ensina e é divido com que aprende. Importa, pois,
que, simultaneamente, o ensinante esteja apresentando um conteúdo e o
aprendente compreendendo-o, assimilando-o, tornando-o seu.
Sem esse ponto de partida
constituído pelos dois primeiros passos do ato de ensinar-aprender ---
apresentação/compreensão/assimilação do conteúdo --- não haverá aprendizagem.
Um aprendente só aprende aquilo que compreende e assimila, isto é,
propriamente, torna seu, igual a si.
Então, tendo em vista
efetivamente ensinar, o educador necessitará estar atento a esse passo da
dinâmica de ensinar-aprender, isto é, que, efetivamente, seu aprendiz tenha se
apropriado compreensivamente do que expôs (por qualquer meio que tenha ocorrido
a exposição).
Reafirmando, nesse passo
do ensinar-aprender deve ocorrer um equilíbrio na dinâmica entre educador e
estudante. Educador e estudante brincam numa gangorra em termos de quem está
mais, ou menos, ativo; em um momento o ensinante e, no momento seguinte, o
aprendente e, desse modo, sucessivamente.
Deste passo em diante, no
processo do ensinar-aprender, o predomínio do sujeito ativo no binômio
ensinante-aprendente será do aprendente. Ele deverá ser sempre o sujeito ativo,
de tal forma que “torne efetivamente seu o conteúdo que está sendo ensinado e
que está aprendendo”.
Desse momento, em diante, o educador terá um papel auxiliar, observando o desempenho do aprendiz (avaliação) e reorientando-o quantas vezes forem necessárias, até que o necessário estabelecido curricularmente seja aprendido. O educador --- como educador --- já deve ter a posse do conteúdo que ensina; quem aprende esse determinado conteúdo é o estudante; por isso, no processo de ensinar-aprender, deste passo em diante, o ator fundamental é o estudante, pois que é ele quem deve aprender. O educador passa a ser seu auxiliar no caminho da aprendizagem. O estudante será o sujeito ativo de sua aprendizagem.
Desse momento, em diante, o educador terá um papel auxiliar, observando o desempenho do aprendiz (avaliação) e reorientando-o quantas vezes forem necessárias, até que o necessário estabelecido curricularmente seja aprendido. O educador --- como educador --- já deve ter a posse do conteúdo que ensina; quem aprende esse determinado conteúdo é o estudante; por isso, no processo de ensinar-aprender, deste passo em diante, o ator fundamental é o estudante, pois que é ele quem deve aprender. O educador passa a ser seu auxiliar no caminho da aprendizagem. O estudante será o sujeito ativo de sua aprendizagem.
III
-
O TERCEIRO PASSO DO ATO DE
ENSINAR-APRENDER: A EXERCITAÇÃO.
Após assimilado um determinado
conteúdo, para que ele se torne uma compreensão ou uma habilidade do
aprendente, importa que ele seja exercitado. Não existe aprendizagem verdadeira
sem exercitação, sem sua apropriação ativa. O ser humano é um ser ativo e, por
isso, aprende ativamente.
A estrutura neurológica
do ser humano é complexa, como vimos sinalizando nos últimos posts deste perfil
no Facebook. Nosso sistema nervoso é composto por aproximadamente 100 milhões
de células nervosas --- neurônios --- e cada uma delas pode realizar mil
conexões, --- sinapses ---, que criam o algoritmo neurológico que sustenta uma
aprendizagem, um hábito; propriamente a memória de um entendimento ou de um
modo de agir ou de fazer alguma coisa (registro permanente de um conhecimento,
de uma habilidade que, na necessidade, pode ser acessado).
Os algoritmos de nossas
aprendizagens constituem-se de sequências, lineares ou ramificadas, de conexões
entre os neurônios, constituindo nossa memória, que para tanto, exigem muitas e
muitas atividades. À medida que necessitamos de um desses conhecimentos, tendo
em vista responder a uma solicitação externa --- venha ela de uma pessoa ou de
uma circunstância ---, toda a rede neurológica relativa a ele se “acende” e,
então, “respondemos”, o que significa agir com os recursos do que fora
aprendido.
Cada um de nós possui
múltiplos conhecimentos e múltiplas habilidades, que constituem nossas
capacidades, que, quando necessário lançamos mão delas. Elas foram construídas
pela exercitação articulada com a compreensão, permanecem latentes e são
“acordadas” nos momentos que delas necessitamos.
Existem pelo menos três
modalidades de exercitação: (01) a exercitação de aquisição e fixação de uma
aprendizagem (exercitação repetitiva); (02) a exercitação de aplicação (quando,
após uma aprendizagem, experimenta-se aplicar esse conhecimento em experiências
paralelas); e (03) a exercitação de recriação (quando o estudante é estimulado a
agir e arrisca a recriar alguma coisa com base naquilo que aprendeu).
01
- Exercitação de aquisição e fixação de uma aprendizagem.
À medida que um conteúdo
qualquer foi (01) exposto e (02) compreendido, para que ele se sedimente na
memória neurológica, importa que ele seja (03) exercitado para a garantia da
aquisição e fixação como um algoritmo na memória do aprendente. Então, quando
necessário, poderá ser acessado.
O leitor poderá tomar
qualquer conteúdo que conhece e que sabe agir a partir dele e verá que o
aprendeu pela compreensão/exercitação e poderá acessá-lo quando dele
necessitar. Esse conhecimento pode ser dirigir um automóvel, utilizar uma
máquina fotográfica, um celular, fazer uma exposição, escrever uma carta,
escrever um bilhete, dirigir-se a algum lugar da cidade, consultar um mapa, fazer
uma determinada cirurgia no caso de um médico-cirurgião; fazer um implante
dentário, no caso de um odontólogo...
Frente a isso, nós,
educadores, necessitamos estar cientes que não basta expor um determinado
conteúdo para que os estudantes tenham, de fato, aprendido. Para além da
exposição, há necessidade da compreensão e da exercitação, em primeiro lugar,
de “repetição”, repetição compreendida, evidentemente, de um determinado
conteúdo. Muito para além de uma repetição mecânica, a exercitação de aquisição
e fixação de um conteúdo é ativa e compreendida. Nada de mecânica.
No início, qualquer
aprendizagem é exigente. Lembrem-se de quanto se iniciaram na escrita e na
leitura. Como era complicado escrever letras como “q”, “b”, “f”. Hoje, adultos,
cada um de nós escreve ao seu jeito e sem nenhuma necessidade de pensar como
são essas letras. A escrita tornou-se habitual. Mas... no período de nossa
alfabetização, essas letras não eram nada fáceis de serem grafadas.
Como professores,
ensinando em sala de aula, importa subsidiar os estudantes com exercícios em
torno dos conteúdos com os quais trabalhamos, se desejamos que, efetivamente,
eles aprendam, isto é, que tomem posse do conhecimento. Os estudantes
aprenderão (adquirirão) um determinado conteúdo através da articulação entre
recepção do conteúdo, sua assimilação e sua exercitação.
02
- Exercitação de aplicação
O segundo modo de
exercitação é a aplicação. Após ter aprendido um determinado conteúdo, um
determinado modo de fazer alguma coisa, importa ampliar as possibilidades desse
conhecimento adquirido e isso pode e deve ser realizado pelos exercícios de
aplicação. Aplicar significa que já detém um conhecimento ou uma habilidade e,
por isso, pode-se aplica-lo ou aplica-la
Após ensinar e um
estudante aprender, nós educadores em sala de aula, podemos e devemos propor
exercícios de aplicação. Exercícios que possibilitem ampliar a compreensão já
adquirida, alargando as possibilidades de uso.
Por exemplo, o estudante
aprendeu a operar com a adição e já exercitou praticar essa operação na solução
de alguns problemas. Então, a pergunta é: que novos problemas podem ser
solucionados com essa operação? O estudante aprendeu a analisar sintaticamente
uma oração com verbo transitivo direto, que outra (ou outras orações) poderá
analisar com esse recurso? Alguém aprendeu fazer bolo com suco de maçã; será
possível fazer um bom bolo com suco de cenoura? Como?
Exercícios de aplicação implicam
que o estudante, após adquirir um conhecimento, aplica-o em problemas paralelos
àquele com o qual o adquiriu. A aplicação amplia e sedimenta a possibilidade de
um determinado conhecimento adquirido.
03
- Os exercícios de recriação
Para além dos exercícios
de aplicação, existem as possibilidades de recriar o que já fora criado no
passado, ensinado e aprendido. Essa recriação possibilita que o aprendiz
observe o algoritmo de criação de alguma coisa desde os seus inícios. Os
exercícios de aquisição e fixação de conhecimento, como também o de aplicação,
ocorrem devido o professor ter elaborado e posto o desafio para que o aprendiz
o resolva, ao passo que o exercício de recriação implica que o estudante se
coloque a possibilidade de recriar a solução já aprendida frente a algum
desafio novo, que se apresenta a ele como um desafio ou que ele coloca a si
mesmo.
O professor, então, não
deverá propor problemas que exijam recriação? Claro que sim. Deverá saber quando
propor essas questões, desde que devem ser compatíveis com as possibilidades dos
estudantes. Deve mesmo ter consciência da necessidade desse passo na
aprendizagem e, então, propor aos estudantes problemas que possibilitem e
recriação de determinados conhecimentos.
Evidentemente que a
recriação de um conhecimento exige muito mais do que a simples exercitação para
aquisição e fixação do conhecimento, como também exigirá muito mais que os
exercícios de aplicação. Aqui haverá necessidade do conhecimento e da
exercitação de um processo por inteiro e não de partes de um todo. Este
exercício implica no algoritmo inteiro de um conteúdo ou de uma ação, o que
exige muito mais do que a dedicação à uma ou outra de suas partes.
IV
– O QUARTO PASSO É A CRIAÇÃO DE ALGO NOVO
O cabedal de
conhecimentos que foi construído e sedimentado ao longo do tempo serve de base
para vivermos bem, como também de base para novas aquisições e para novas criações;
porém, aqui e acolá, ouvimos também dizer que alguém, que nunca estudou, criou
alguma coisa muito nova. De fato, temos um ou outro episódio em que um sujeito
tem uma intuição, contudo, não sabe como realiza-la.
Nesse caso, terá que
buscar as bases (conhecimentos) que possibilitem dar “materialidade”, forma e
consistência, à sua intuição. As
criações novas ou se assentam sobre uma base cognitiva já existente do seu autor,
ou vai exigir esforço para que essa base seja construída. Não há como sustentar
uma intuição nova sem base cognitiva.
Na história humana,
existem exemplos das duas possibilidades. De um lado, estão aqueles que, de
tanto se dedicarem a um campo de conhecimentos, passaram a servir-se de seus próprios
conhecimentos, já sedimentados, para criar novas e novas soluções. Se diz,
popularmente, que um talento atrai outro talento.
De outro lado, existem
aqueles que tem intuições, mas não tem a posse de suportes teóricos e práticos
para dar corpo à sua intuição. Nesse caso, necessitará de investimentos para
adquirir essa base ou solicitará auxílio de outro que poderá dar suporte à
materialização da sua intuição. Uma intuição, para ganhar forma, necessitará de
suporte cognitivo e, portanto, de investimento.
Tendo presente esses dois
lados, sabemos que um sujeito que se especializou em algum campo de
conhecimento terá muitas e muitas possibilidades de, de um lado, identificar
carências de conhecimentos, lacunas, e, de outro, criar soluções novas no seu campo
de atuação. No outro extremo, o sujeito que tem uma intuição, mas não tem a
posse de compreensões teórico-práticas suficientes para levar à frente sua
intuição, ou vai solicitar ajuda de quem pode dar-lhe suporte, ou vai aprender
os conhecimentos necessários para que sua intuição ganhe forma e materialidade.
Não existe criação do
nada. Se diz teologicamente que Deus criou o mundo do nada. Mas, isso só teria
se dado uma vez. Após esse ponto de partida, toda criação se sustenta numa base
anterior existente. Caso não conheça uma solução para minha intuição, necessito
buscá-la.
Nosso investimento, como
educadores escolares, tem a ver com o fato de garantirmos aprendizagens
significativas aos nossos estudantes, de tal forma que eles as possam utilizar
no momento em que tiverem necessidade delas. Se diz que Bill Gates e Steve Jobs
fugiram da escola e foram, ou são, empresários bem-sucedidos. Importa lembrar
que as intuições de ambos sempre foram sustentadas por conhecimentos de
engenheiros e técnicos que deram forma às suas percepções, visões e intuições.
No caso, não devemos, creio eu, apostar nas exceções, mas sim na totalidade dos
nossos educandos, por isso, seguir o algoritmo do ensinar-aprender, aqui
exposto, pode ser um caminho consistente para atuar junto aos nossos
estudantes, a fim de que, em aprendendo, tornem-se o que terão que se tornar na
vida adulta.
Então, em síntese, o
caminho do ensinar-aprender vai do expor (01), passando pelo
compreender/assimilar (02), exercitar (de forma repetitiva, aplicativa e
re-criativa)(03), chegando a criação do novo conhecimento(04).
Cada educador deverá ter
o bom senso de saber quando passar de um passo para om outro --- especialmente
os passos relativos aos exercícios de re-criação de conhecimentos anteriores,
assim como aqueles relativos à criação de novos conhecimentos --- desde que esses
são passos mais exigentes em termos de base, invenção e materialização de algo
novo.
APRENDIZAGEM
E ARTICULAÇÃO ENTRE OS TRÊS SEGMENTOS DO CÉREBRO
A aprendizagem necessita
ser ativa, desde que o ser humano é ativo, mas, ao mesmo tempo, necessita ser
harmônica em termos da integração, seja dos três segmentos cerebrais, seja das
três camadas embrionárias constitutivas o ser humano.
Em cada prática de
ensinar e aprender, importa que reptiliano, límbico e neocortex estejam atuando
ao mesmo tempo e harmonicamente. O mesmo deve ocorrer com as três camadas
embrionárias; “pensar, sentir e agir” necessitam atuar conjuntamente, a fim de
a aprendizagem não se torne um frankstein: “pensamento, sem sentimento”;
“sentimento sem pensamento”; “pensamento sem sentimento e sem ação”; “ação, sem
sentimento e sem pensamento”... À medida que o ser humano é um todo, como um
todo deve funcionar.
Para tanto, o educador é
peça fundamental; na função de liderança --- Secretaria, escola, grupo, sala de
aula ---, sua instituição terá a sua qualidade.
A sala de aula será o que
o educador for. Se ele for melancólico, suas classes serão melancólicas; se ele
for indisciplinado, suas classes serão indisciplinadas; se ele for autoritário
e rígido, todos os seus estudantes terão medo... e assim por diante.
Numa escola, esteja no
posto que estiver, o educador é o líder e o líder “dá o tom” ao movimento dos
seus liderados.
Nesse contexto de
compreensão, os passos de ensinar-aprender, acima expostos, não podem ser
utilizados de forma mecânica, isto é, sem que integrem, ao mesmo tempo, pensar,
sentir e agir, ou reptiliano, límbico, neocortex.
Se os passos, acima
indicados, forem utilizados de forma mecânica, a aprendizagem dos educandos não
se fará de modo satisfatório, desde que se dará ao “modo fankstein” assinalado,
isto é, dissociadas: o pensar de um lado, o sentir de outro e o agir de outro
mais. Ocorrendo dessa forma, a aprendizagem não dará suporte à integração seja
dos três segmentos funcionais do sistema nervoso, seja à integração das três
camadas embrionárias constitutivas o ser humano; e isso refletirá no agir
cotidiano de cada. Então, alguém poderá ter uma informação, mas sua conduta
será diversa da sua compreensão, desde que o verdadeiro afeto está separado da
simples cognição. Vemos isso todos os dias nos noticiários jornalísticos, assim
como no nosso entrono.
O educador necessitará
estar consciente e agindo de forma integrada em sua vida, a fim de que seus
estudantes aprendam esse modo de ser. Se o líder “pensa, mas não sente”; “se
sente, mas não pensa”; “se pensa, mas não age”; “se age, sem pensar”; “ se
sente, mas não age”; “se age, mas não sente”, seus estudantes aprenderão a
viver dessa forma com os seus segmentos cerebrais funcionais ou com suas
camadas embrionárias, isto é, em desarmonia interna e externa.
O educador necessitará
“ter o olho brilhando” pelo que faz, pela sua forma de agir. Então, seus
educandos o seguirão, seja estudando matemática, língua portuguesa, língua
estrangeira, geografia, física, química, história, sociologia, ou qualquer
outra área de conhecimentos. No ato de ensinar, como no ato de aprender,
reptiliano, límbico, neocortex, como endoderma, mesoderma e ectoderma
necessitam funcionar harmonicamente, desde que cada um deles expressa uma
faceta do modo de ser do ser humano; todas elas atuando conjuntamente configuram
quem é o ser humano na expressão mais evoluída da natureza.
Os três segmentos
cerebrais, assim como as três camadas embrionárias, atuarão harmonicamente na
aprendizagem se o ensinante atuar dessa forma. Caso contrário as aprendizagens
dar-se-ão de modo mecânico, e, pois, sem vida, sem vibração, sem a integração
necessária para que a vida seja como a natureza a criou.
Não adiantará seguir
todos os passos do ensinar-aprender sinalizados se eles forem praticados mecanicamente.
Necessitarão ser praticados com vida, entusiasmo, prazer, alegria.
Um líder desanimado
produz liderados desanimados, um líder melancólico estimulará a melancolia...;
mas, um líder que ama e gosta do que faz estimulará o amor e o gosto de todos
por iniciar-se a fazer o que ele faz e da forma como ele faz, à medida que é vivo
e belo.
Repetindo, para concluir,
os passos do ensinar-aprender não servirão para muita coisa se forem praticados
de modo mecânico, mesmo que seguindo fielmente todos os detalhes sugeridos.
Importa que os detalhes sejam utilizados com vida, entusiasmo, vibração,
alegria, prazer.
Em síntese, se os olhos
do educador brilhar pelo que faz, os olhos dos seus educandos também brilharão.
Se seus olhos forem mortiços, os olhos dos estudantes também o serão. Aprendente
aprende na relação com o outro, com o campo de energia circulante.
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OBSERVAÇÃO – Na aba direita deste blog está publicado o índice de todos os textos publicados neste perfil. O leitor poderá cotejá-lo, escolhendo conteúdos que possam interessar-lhe.
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(01) Em
outro momento, abordei esse tema em Avaliação
da aprendizagem escolar: estudos e proposições, Cortez Editora, São Paulo,
22ª edição, 1ª reimpressão, 2012, capítulo “Por= uma prática docente crítica e construtiva”,
páginas 139-170.
(02) David
Boadella é um pesquisador inglês que criou a Biossíntese, área psicoterapêutica
e educativa que tem por objetivo cuidar do ser humano, buscando reequilibrar a
harmonia entre as camadas embrionárias, e, pois, entre o pensar, sentir e agir.
No Brasil existem dois livros seus publicados --- Nos Caminhos de Reich e
Correntes da vida: introdução à Biossíntese, ambos publicados pela Summus
Editorial, SP.
celular
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