sábado, 27 de setembro de 2014

34 - Premio Jabuti pelo meu último livro sobre Avaliação da aprendizagem

Texto publicado anteriormente me 02 de dezembro de 2012



Amigos e amigas,


Em janeiro do ano de 2011, a Cortez Editora colocou a público meu livro Avaliação da aprendizagem: componente do ato pedagógico. Anunciei-o neste blog em junho desse ano.

Agora, no dia 28/11/2012, recebi uma estatueta do Prêmio Jabuti na categoria Educação, outorgado pela Câmara Brasileira do Livro, em cerimônia na Sala São Paulo, São Paulo capital.

Alegro-me com todos os educadores. Penso que esse Prêmio, além de ser para mim e para o Editor José Xavier Cortez e sua equipe da Cortez Editora, é para toros nós educadores, que investimos no trânsito da prática dos exames escolares para a prática da avaliação, como recurso que nos auxilia na construção do sucesso em nossas atividades de educadores escolares ou de outras áreas educativas.

Minha gratidão a todos.

Cipriano Luckesi






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33 - ENEM: avaliação, seleção e orientação para o ensino médio

Texto publicado anteriormente no Blog Terra na data 14 de novembro de 2012.
Cipriano Luckesi

O ENEM (Exame Nacional de Ensino Médio) nasceu no movimento de avaliação institucional e de larga escala, implantado no Brasil, assim como em outros países, desde os finais dos anos 1980 e inícios dos anos 1990. Com essa postura se reconheceu que o fracasso ou sucesso na educação não é só responsabilidade do educando, como sempre se compreendeu desde o século XVI até nossos dias. Com isso, se assumiu que também o sistema de ensino fracassa, caso ele não tome em consideração as variáveis que garantem a qualidade do investimento, seja ele financeiro, de espaço físico e de pessoal.

A primeira versão do Enem é de 1998. No ano de 2009, o Ministério da Educação decidiu incorporar ao Enem, além de um recurso de avaliação, um recurso de seleção para o Ensino Superior, dando a ele uma qualidade e um status, já existente em outros países, como o “Exame de Maturidade”, praticado na Europa no final do Ensino Médio e que possibilita o acesso ao Ensino Superior; o mesmo ocorrendo com o SAT (Scholastic Assessment Test), nos Estados Unidos.

Pareceria que o Mec só estaria assumindo uma prática, que, de alguma forma, já vinha sendo utilizada por algumas instituições de ensino superior no Brasil, que vinham utilizando os resultados do Enem como recurso de seleção. Porém, a meu ver, é muito mais que isso.
O Enem tem matrizes (estrutura curricular por áreas de conhecimentos, acompanhada do mapa das habilidades e competências, que servem de base para construir os instrumentos de coleta de dados sobre o desempenho dos educandos) um tanto diferente das matrizes, hoje, utilizadas em nossas escolas de Ensino Médio.

De fato, entendo que o novo Enem terá um papel que vai, e irá, muito além da avaliação do ensino médio e da seleção para o ensino superior. É um modo de subsidiar um novo rumo para o Ensino Médio no país.
Isso fica claro se se compreender o que vem ocorrendo da forma como se segue.

Nos últimos cinquenta anos da educação nacional, o vestibular deu a forma ao Ensino Médio (currículo e práticas docentes, voltados para o vestibular) que temos hoje. O novo Enem, a partir de 2009, à medida que, além de ser recurso de avaliação do sistema nacional de ensino, também seleciona para o ensino superior, deverá, a curto e médio prazos, exigir das escolas e dos educadores adaptações às novas exigências para a seleção do ensino superior, o que implicará num novo modelo de ensino médio, que ainda, de alguma forma, estará “preparando para o ensino superior”. Ficando ciente de que as matrizes do Enem, como base das práticas seletivas para o ensino superior, “obrigariam” novas orientações para o Ensino Médio, o que será bastante saudável. Nossos educandos, matriculados no terceiro ano do Ensino Médio, passam ao menos esse ano letivo bastante estressados com o vestibular e pouco atentos à sua formação como seres humanos e cidadãos.

Sustentando a prática do novo Enem, por um médio tempo, como o fez o vestibular anteriormente, determinará também o Ensino Médio, a partir do fato de que escolas e professores se adaptarão às novas regras seletivas, o que implicará que passarão a utilizar as matrizes do Enem em seu modo de ser e agir na prática educativa. Ou seja, escolas e professores estarão se adaptando às novas regras de seleção para o ensino superior, o que implicará num ar novo para o Ensino Médio no país; certamente muito menos formalista e mais vital que o modelo atual.

Desse modo, a meu ver, o novo Enem deve ser sustentado seja como recurso de avaliação do Ensino Médio no país (política e administrativamente, necessitamos de uma avaliação do sistema de ensino), seja como recurso de seleção (um modo único de selecionar para o ensino superior em todo o país, o que também obrigará que as escolas dos diversos rincões desta nossa terra investir qualidade do ensino, orientadas pelos novos currículos = matrizes do Enem). Essa dinâmica, com certeza, trará significativos desdobramentos pedagógicos para o Ensino Médio.







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32 - Avaliação da aprendizagem, institucional e de larga escala

Salvador, 15 de novembro de 2012
Cipriano Luckesi


Até finais dos anos 1980 e inícios dos anos 1990, predominantemente, na prática educativa, considerávamos que o responsável pelo fracasso escolar era o educando. Era ele que não desejava ou não investia em sua aprendizagem, por isso era eventualmente ou sucessivamente reprovado.

Por esses anos, no mundo e no Brasil, começou-se a perceber que o sistema de ensino também poderia ser o responsável pelo fracasso escolar. Então, timidamente, para além da avaliação da aprendizagem, iniciamos a pensar e ensaiar práticas avaliativas que fossem para além da aprendizagem em sala de aulas, chagando, hoje, às práticas de avaliação institucional e de larga escala.

A compreensão de que a qualidade da aprendizagem do educando, em primeiro lugar, depende da instituição que oferece o ensino se ampliou e abrimos as portas para esses novos campos da avaliação em educação.

O panorama da avaliação educacional, no Brasil, sob a ótima sistêmica, pode ser assim descrito, de forma bem geral. Iniciamos esse novo olhar sobre a avaliação em educação pelo Ensino Superior. Em 1982, a Andes - Associação Nacional dos Docentes do Ensino Superior propôs a avaliação institucional, como um recurso subsidiário da melhoria do desempenho de cada instituição. Em 1983, o MEC institui o PARU – Programa de Avaliação da Reforma Universitária. Em 1993, foi criado o PAIUB – Programa de Avaliação Institucional da Universidade Brasileira. Em 1996, foi implantado o Exame Nacional de Curso, popularmente denominado “Provão”, que, em 2004, transformou-se no SINAES – Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior. Em termos de datas iniciais, seguimos pelo Ensino Básico. O Sistema de Avaliação do Ensino Básico — SAEB — foi criado em 1988, com sua primeira aplicação em 1990, que, do ponto de vista da avaliação da educação no país, sofreu os aperfeiçoamentos com a Prova Brasil (2005) e com o IDEB — Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (2007). Por último, chegamos ao Ensino Médio. Em 1998, foi implantado o ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio; cuja expressão atual decorre do denominado “novo Enem” (2009).

Esse panorama de acontecimentos e datas revela que o país deixou de crer que somente os educandos são os responsáveis pelo seu sucesso ou seu fracasso na escola. O sistema também pode fracassar. E, se se deseja uma efetividade satisfatória nos resultados, há que se utilizar os dados da avaliação para proceder aos investimentos necessários para que resultados cada vez mais satisfatórios possam ser alcançados.

Dentro dessa perspectiva, os três níveis de avaliação em educação citados são necessários: (01) “a avaliação da aprendizagem” que tem por objetivo diagnosticar, acompanhar e certificar o educando em seu percurso de aprender na vida escolar. Importa o sucesso de cada um e de todos os educandos em suas aprendizagens e seus consequentes desempenhos; (02) importa, por outro lado, que a “instituição” esteja constantemente avaliando-se e sendo avaliada, cujos resultados devem subsidiar novas e necessárias decisões, tendo em vista que seu desempenho, como instituição, apresente resultados cada vez mais satisfatórios, o que significa que os educandos, que passam por ela, aprendam o que necessitam aprender; (03) por último, há que se olhar para o “sistema nacional de ensino”, no que se refere à sua qualidade e eficiência. Chegamos, então, ao âmbito da “avaliação de larga escala”, o que implica que o país inteiro esteja atento aos resultados de suas variadas atividades institucionais de ensino. O país necessita de cuidar de sua educação em todas as instâncias, desde as políticas públicas, passando pelos projetos e financiamentos, chegando à sala de aula e aos educandos.

Todas essas formas de avaliação são fundamentais para a educação no país. A avaliação da aprendizagem nos permite acompanhar nossos educandos individualmente em suas aprendizagens, carências e necessidades de ajuda em seu percurso de formação; a avaliação institucional é a aliada dos gestores da educação na busca da efetividade significativa de suas instituições seja no atendimento aos educandos, seja também na elevação sociocultural da comunidade onde se encontra situada; e, por fim, a avaliação de larga escala nos retrata como país está no que se refere à qualidade do ensino e sua efetividade. Esses três níveis de avaliação são necessários para que, de um lado, olhemos para nossos educandos, mas também para o sistema de ensino que os atende. Se se deseja qualidade, não há como fugir dos atos avaliativos, pois que eles nos dizem se os resultados de nossa ação já são satisfatórios oi se exigem mais e mais investimentos, sejam eles financeiros ou de efetiva ação institucional e pedagógica.

Importa observar que a avaliação de larga escala se inicia com a turma de estudantes, atendida por cada professor. Nesse sentido, em nossas salas de aula, não basta avaliar a aprendizagem individual de cada educando. Isso é essencial, mas será pouco, se, de imediato, não olharmos para o desempenho da turma como um todo na qual está matriculado um determinado estudante.

A exemplo, vamos relembrar que, se, em uma turma com 40 estudantes, 10 estudantes, numa escala de qualificações que vai de 0 (zero) a 10,0, obtém qualificação 7,0 ou superior a essa qualificação (qualificações necessárias segundo o padrão de uma determinada escola ou de um subsistema) e os outros 30 obtêm qualificações abaixo de 7,0, chegando até o 0 (zero), há alguma coisa que não está bem no ensino e na aprendizagem dessa turma.
Se o mínimo necessário é que todos obtenham a qualificação 7,0, deve-se investir para que todos cheguem a esse patamar. Se esse é o mínimo necessário, todos devem chegar a esse patamar e, para tanto, haverá necessidade de investimento.

Então, a avaliação da turma, portanto, para além da avaliação da aprendizagem individual, é o início da avaliação de larga escala, o que coloca a questão de que, junto com o educando individual que fracassa, o sistema fracassa, pois que ele é o responsável pela produção de efeitos significativos na educação.


O educador, em sala de aula, atendendo aos educandos na turma ou individualmente, do ponto de vista ascendente, é o primeiro elo do sistema de ensino e, na direção descendente, ele é o seu último elo. O “sistema” necessita de cuidar das “instituições” (escolas) para que estas cuidem dos “educadores” e estes cuidem dos “educandos”. O sucesso depende da cadeia inteira de responsabilidades e a avaliação é e deve ser a aliada de todos, subsidiando as mais diversas e variadas tomadas de decisões, tendo em vista o sucesso.








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31 - Ensinar, aprender e avaliar: tres atos distintos

Texto publicado anteriormente no Blog Terra em 16 de novembro de 2012.
Cipriano Luckesi

Aqui e acolá, tenho entrado em contato com escritos que confundem os atos de ensinar e aprender com o de avaliar. Ensinar tem a ver com o ato do ensinante que propõe ao aprendente desafios novos, estimulando à aprendizagem, isto é, à aquisição de novas compreensões da realidade, assim como de novas condutas (modos de agir, de fazer, hábitos).

Aprender tem a ver com o ato do aprendente. É ele que faz o caminho de adquirir novas compreensões, assim como novas formas de agir e de fazer. É ele quem adquire novos hábitos, tendo por base a aprendizagem.

O ato de avaliar incide sobre a qualidade do aprendido, que, por sua vez, é fruto da aprendizagem, por sua vez, estimulada pelo ensinamento. Mesmo que se leve em conta a ideia de processo, importa compreender que o processo de aprender é constituído por sucessivas aprendizagens, o que dá sucessivos “aprendidos”.

Ultimamente, tenho mantido contato com diversas leituras que tratam da aprendizagem colaborativa, que me parece um ótimo meio de aprender e de socializar o processo de aprender, onde se fazem presentes a apresentação de conteúdos, seja por uma ensinante seja pelos próprios colaboradores da aprendizagem, diálogo para o seu entendimentos, trocas de compreensões e de práticas; afinal, processo de aprendizagem. Contudo, ocorre que também vários textos, com os quais tenho entrado em contato, confundem o ato de aprender com o de avaliar, ou seja, ocorrendo o ato colaborativo (ou os atos colaborativos) de aprender isso não significa que a aprendizagem já ocorreu. Só podemos reconhecer uma aprendizagem efetivamente realizada com a confirmação da posse do conteúdo (informação + habilidades) por parte do aprendiz.

Essa compreensão não infirma a aprendizagem colaborativa nem o olhar sobre o processo de aprendizagem. Somente sinaliza que pode haver um processo colaborativo sem que a aprendizagem ainda tenha sido feita. A manifestação da aprendizagem efetivamente realizada se expressa no “desempenho” do aprendente, revelando que aprendeu. O processo colaborativo é “um processo de aprender”, o que não quer dizer que, “dado um processo colaborativo de aprender”, a aprendizagem “efetivamente tenha se dado”. O ato colaborativo é processo, o aprendido é produto. Pode ser até mesmo um produto parcial, mas sempre será produto.

A distinção entre os atos de ensinar, aprender e avaliar permite a nós, educadores e ensinantes, não confundirmos as coisas, podendo chegar a assumir que um aprendente aprendeu o que necessitava aprender, exclusivamente devido ter participado de atos colaborativos de aprender. Mesmo com a excelência dos atos colaborativos de aprender, o avaliador necessita de testar o aprendido, tendo em vista ter ciência da qualidade do novo modo de agir do aprendente.
Hoje, com o ensino à distância, que, cada vez mais, tem sido colaborativo, por vezes, na literatura, vê-se o cuidado com os processos colaborativos, como se eles já revelassem a aprendizagem satisfatória. No entanto, poderá ocorrer um processo colaborativo de aprender, sem que se chegue a efetiva aprendizagem com a qualidade desejada.
Por outro lado, vale observar que resultados de atividades colaborativas não necessariamente revelam competências individuais. Revelam, sim, competências coletivas de um determinado grupo.

Se se deseja detectar se cada estudante — participante do grupo —, individualmente, aprendeu o necessário, os desempenhos coletivos não são suficientes como indicadores de suas aprendizagens. Se se deseja efetivamente diagnosticar se determinado estudante aprendeu alguma coisa, importa investigar o seu desempenho e não o do grupo.
Por outro lado, se somente se deseja detectar como um grupo se desempenha, sem desejar ter presente o desempenho de cada um dos membros do grupo, basta o desempenho do grupo numa determinada tarefa.
Quando, aqui, estou me referindo a “tarefa” isso pode ser o desempenho em realizar uma “tarefa produtiva com expressão material (= fazer alguma coisa)” ou uma “tarefa cognitiva (= compreender, fazer uma operação mental, planejar…) ”.

Enfim, importa não confundir “processo” com “produto” e, no caso, quando utilizamos a expressão “processo de aprendizagem”, estamos falando de sucessivas aprendizagens parciais, que, ao longo do algoritmo de uma aprendizagem, revelam que o que fora ensinado fora “aprendido”. Isso significa que não temos como detectar alguma coisa “acontecendo”; conseguimos detectar os “acontecidos”, por menores que eles sejam. Bergson, filósofo francês de finais do século 19, nos lembra que a vida é um “ela vital” e que ela só pode ser efetivamente compreendida dessa forma, à medida que nossa mente, no seu modo de ser, só é capaz de apreender o “acontecido” e não o “acontecente”. Quando percebemos, já ocorreu, já se “materializou” em algum ato observável.

Concluindo, importa ter clareza sobre os três atos anunciados no título deste texto: ensinar, aprender, avaliar.

Podemos até mesmo assumir que os resultados “processuais” (ter presente a compreensão sobre “processo”, acima exposta) são suficientes para nós assumirmos que um aprendente efetivamente “aprendeu” alguma coisa; todavia, também importa observar que, por vezes, poderemos nos enganar com os dados que “parecem” indicar uma aprendizagem, que efetivamente, ainda não ocorreu. A efetiva aprendizagem só pode ser detectada pelo desempenho, efetivamente observado, seja de forma direta ou indireta através de instrumentos de coleta de dados.







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30 - Meu novo livro sobre avaliação da aprendizagem

Texto publicado anteriormente no Blog Terra
Salvador, 09 de julho de 2011
Cipriano Luckesi



Em janeiro deste ano de 2011, a Cortez Editora colocou no mercado um novo livro meu abordando o tema da avaliação da aprendizagem. Ele se intitula Avaliação da aprendizagem: componente do ato pedagógico, Cortez Editora, São Paulo, 2011, 448 págs.

O livro aborda três grandes temas:

01) articulação entre Projeto Político Pedagógico (PPP) e avaliação da aprendizagem. A avaliação da aprendizagem só existe a serviço do PPP. Sem essa articulação, a avaliação praticamente não faz sentido, pois que ela existe como subsidiária do sucesso desse projeto. Ela o serve, sinalizando a qualidade dos resultados que estão sendo obtidos com sua realização e, em caso de qualidade insatisfatória, aponta para a necessidade de intervenção na busca da melhoria.

02) o segundo tema, abordado na Parte II do livro, trata de definir avaliação da aprendizagem como "ato de investigar a qualidade dos resultados obtidos ou em construção e, se necessário, intervir para redimensionar a ação pedagógica, tendo em vista melhores resultados". Nessa parte do livro são tratados os conceitos de avaliação da aprendizagem, suas limitações históricas, psicológicas e sociais --- afinal, nossas dificuldades para praticar a avaliação da aprendizagem. Além disso, é abordado, de forma crítica e ao mesmo tempo construtiva, o tema dos instrumentos de coleta de dados para a avaliação da aprendizagem. O ato de avaliar é um ato de investigar e, na investigação, há necessidade de coleta de dados e, para tanto, necessitamos de instrumentos de coleta de dados elaborados segundo as regras da metodologia científica.

03) a terceira parte é constituída por "temas correlatos", isto é, uma abordagem da necessidade da postura ética na prática da avaliação da aprendizagem e mais um capítulo, intitulado "Catado", que contempla "perguntas e respostas" sobre variados temas em torno do assunto avaliação da aprendizagem, que merecem alguma abordagem e não foram tratados no decorrer da obra. Acredito que produzi uma obra abrangente e significativa para o movimento de expansão da cultura da avaliação da aprendizagem em nossas escolas. O livro pode ser encontrado nas livrarias ou por solicitação à Cortez Editora, através de seu site --- www.cortezeditora.com.br

Desejo a todos bons estudos.

Cipriano Luckesi





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29 - Sobre a simplicidade do ato de avaliar a aprendizagem

Publicado anteriormente no Blog Terra
Salvador, 19 de junho de 2010.
Cipriano Luckesi

O ato de avaliar a aprendizagem na escola tem algumas características epistemológicas fundamentais para o seu entendimento e sua prática, já tratadas ao longo dos artigos deste blog, todavia ele se expressa de uma forma muito simples: “o educador pergunta ao seu educando se ele aprendeu o que foi ensinado; caso tenha aprendido, ótimo; caso não tenha aprendido ainda, vai receber um reforço de ensino para que aprenda, pois que os conteúdos ensinados necessitam de ser aprendidos”. Simples, muito simples!

Todavia, nós educadores — em função da própria história da educação escolar no ocidente, do século XVI para cá, em função da trama político-ideológica do controle social, assim como em função da trama psicológico-emocional das relações interpessoais, presentes na prática da avaliação da aprendizagem — distorcemos o ato de avaliar. Introduzimos no seu campo de ação vieses que não lhe pertencem, porém que assumimos como se essencialmente lhe pertencessem.

Nos instrumentos de coleta de dados, introduzimos dificuldades excessivas que não apareceram no ensino, introduzimos expressões linguísticas incompreensíveis para os educandos, introduzimos armadilhas para “ver se eles são capazes de desvendar”, introduzimos questões e situações-problemas muito mais complexas do que aquelas com as quais praticamos o ensino, introduzimos questões e situações-problemas que exigem procedimentos metodológicos diferentes daqueles que foram utilizados em sala de aulas. Isso só para citar alguns dos desvios comuns na elaboração e uso de instrumentos de coleta de dados para a avaliação da aprendizagem. A imaginação humana é fértil para inventar esses e muitos outros desvios, tendo em vista justificar suas crenças, muitas vezes inconscientes.

Caso abramos mão dessas distorções, o ato de avaliar a aprendizagem se apresentará a todos nós na sua simplicidade que é — através de algum recurso que possibilite a observação e a consequente descritiva da conduta do educando, isto é, através de algum instrumento de coleta de dados que seja bem elaborado — “pedir ao estudante que manifeste se aprendeu, ou ainda não, o que nós ensinamos, para que possamos, se necessário, ensinar-lhe de novo, pois que o que importa é aprender”. Simples, mas histórica, política e emocionalmente complicado! Incluímos no ato de avaliar o que — epistemológica e metodologicamente — não lhe pertence.

Talvez, se abrirmos mão de nosso “suposto lugar de poder” — como lembram os psicanalistas —, ou, ainda, se abrirmos mão de nossa “compulsão de educar” — como lembra Wilhem Reich —, certamente que poderemos, nos atos de avaliar a aprendizagem, nos atermos à sua simplicidade: “simplesmente necessitar de saber se o educando aprendeu o que ensinamos, tendo em vista ensinar-lhe melhor”.

Aprovar ou reprovar, estabelecer listas classificatórias (estabelecer o ranking) são práticas externas à avaliação em geral assim como à avaliação da aprendizagem, que trazem muitas mazelas para dentro dessa prática. Esses modos de somente turvam o campo da avaliação da aprendizagem, em prejuízo do educando e da educação como sistema.

Esse texto é um convite para pensar, sentir e aprender a agir de uma forma simples, direta, saudável e compatível com aquilo que significa avaliar, isto é, investigar a qualidade da realidade e, se necessário, proceder alguma intervenção para que ela possa ser melhor e mais saudável.





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28 - Sobre “medir conhecimento”, “avaliação como modo de discriminação”, “curva de Gauss”, “conteúdos mínimos necessários”

Texto publicado anteriormente no Terra Blog, em 19 junho de 2010
Cipriano Luckesi


Após uma conferência, recebi pela internet algumas perguntas e alguns comentários, cujas respostas partilho com todos os interessados, expressando minha gratidão ao emissor da mensagem, que provocou as considerações que se seguem sobre questões metodológicas da avaliação, bastante específicas.

Pergunta: Durante a graduação sempre achei que fui "avaliado" de forma injusta, pois muitas vezes os professores davam notas como 5,1 ou 4,9 e me questinava: "o que significa 0,1 (um décimo) do meu conhecimento?" Então surgiu a minha primeira questão sobre a avaliação: "Como inferir sobre o conhecimento de outra pessoa?" [procuro pensar nessa questão usando o termo "outra pessoa" de modo filosófico, psicanalítico] .

De fato, é impossível medir uma variação da inteligência de alguém em termos de décimos. Isso só pode ser feito em função de se admitir uma política classificatória em termos de valores numéricos utilizados como recursos de expressão dos pontos obtidos através de acertos e erros num determinado teste. Os procedimentos classificatórios têm mais a ver com concurso do que com avaliação da aprendizagem. O modelo classificatório foi importado de fora da escola para dentro da escola. Quando os exames escolares foram sistematizados no século XVI, o modelo proveio de sistemas classificatórios de fora da escola. Por exemplo, três mil anos antes da era cristã, os chineses se serviam de provas para selecionar novos membros para o exército. Sendo seletivo, o processo tinha por base a classificação. A escola importou esse modelo, sem um crivo crítico e, desse modo, até hoje, usamos no nosso cotidiano escolar o modelo classificatório.

Porém, o ato de avaliar não exige um modelo classificatório; ele, por si, é estranho à avaliação. Daí a inadequação ou “injustiça” como você denomina.

Uma observação; Outra coisa que percebi, principalmente após ler um pouco de Pierre Bourdieu - especialmente sobre o conceito de "capital cultural" - é que a avaliação pode ser um forte instrumento de discriminação. Tento minimizar, pois para mim, não importa a "nota per si" mas o caminho percorrido pelo aluno para conseguir aquela determinada nota, pois sei que para muitos alunos conseguir tirar 4 ou 5 já é um esforço monumental pois muitos deles estudam somente na escola, não tendo nenhum apoio dos pais, seja por ausencia ou por falta de escolaridade. Enquanto outros dispoem de largos recursos em casa….

São duas coisas diferentes: uma é a questão do uso inadequado da avaliação como recurso de discriminação e outro é a questão da efetiva aprendizagem, ou não, dos educandos.

Na história da educação, existem vários estudos, como os de Pierre Bourdieu, de Michel Foucault, de Philippe Perrenoud, que abordam, dentro de suas respectivas perspectivas, a questão de como os atos examinativos (que eles denominam, inadequadamente, de “atos avaliativos”) são discriminadores, do ponto de vista sociológico. Concordo com essa tese, na medida em que em nossa história social, efetivamente, os atoss examinativos prestaram-se a esse papel e ainda prestam. Pierre Bourdieu fala da violência simbólica, Michel Foucault do micropoder que a tudo controla e Perrenoud fala das duas lógicas, uma aparente (avaliar) e outra oculta (discriminar). Todavia, esses, efetivamente não foram atos avaliativos, mas sim examinativos (classificatórios).

A avaliação, para ser avaliação não necessita da classificação. O ato de avaliar é um ato de investigar a qualidade do resultado da ação. O que importa saber é se ele tem a qualidade que deveria ter. Somente isso. Não necessita de ser comparado a outro resultado. A qualificação da realidade, no ato de avaliar, tem sua base na comparação da realidade descrita com um critério, mas não com outro resultado. Desse modo, a avaliação, por si, somente detecta a qualidade do resultado, e, por isso, não discrimina ninguém. Ela diagnostica uma situação, porém nem julga nem discrimina. O julgamento e a discriminação decorrem de elementos externos à avaliação, propriamente dita. Para avaliar dez estudantes, não há nenhuma necessidade de compará-los entre si. Cada um necessita de ser comparado ao seu próprio desempenho, ou seja, cada um aprendeu ou não de modo satisfatório o que tinha que aprender. E isso basta, pois que só a partir daí ele poderá ser reorientado.

Outra observação: Gostaria de saber se "normalização de notas" é um processo justo? Darei um exemplo. Quando preparo uma prova e a maior nota da sala é, por exemplo, 8 sei que houve alguma falha no processo. Então uso uma regra de três, fazendo com que a maior nota seja equivalente a 10 e as outras são calculadas com base nessa razão.

O termo “normalização” tem sua origem em Gauss, que descobriu que tudo na vida pode ser distribuído, segundo uma curva estatística denominada “normal”, ou seja, sempre haverá um segmento inferior, um médio e um superior um determinado grupo, organizado dentro de uma escala que vai do menor para o maior.

Com essa abordagem nunca conseguiríamos uma curva assimétrica em “j”, ou seja, todos classificados no segmento superior da curva. Quando você toma a maior nota e a assume como o maior valor de referência ( “dez”) e, a seguir, distribui todos os outros estudantes proporcionalmente a este, adota a “distribuição normal”, de Gauss, como o parâmetro. Usando esse procedimento você mantém sempre a discriminação. Os estatísticos, que, efetivamente, trabalham com avaliação e não com o rankeamento dos participantes de uma turma de estudantes, não usam a curva de Gauss como recurso para atribuição de qualidade ao desempenho dos estudantes, mas sim o critério, ou seja, o padrão de resposta desejado. Em avaliação, o que podemos dizer é que um estudante aprendeu ou não o que lhe fora ensinado. Somente isso. E, a partir disso, se necessário, proceder a reorientação para que aprenda o que necessita de aprender.

O rankeamento (classificação) é uma decisão externa à avaliação. Ela, sim, é uma escolha totalmente política, porque desnecessária. Então, na sua prática, se deseja que, efetivamente, seus estudantes aprendam o que necessitam de aprender, não deverá tomar a maior nossa e assumi-la como “dez” e, a seguir, rankear os outros estudantes, mas, sim, ensinar cada um, para que atinja o mínimo necessário e, então, todos estarão, minimamente, no mesmo nível de aprendizagem — o necessário, nem mais nem menos que isso.

Por último: Em tempo: Como dar conta dos conteúdos mínimos e ainda conseguir com que todos os alunos tenham uma ótima curva de aproveitamento, mesmo quando muitos deles não demostram nenhum tipo de respeito pela escola, pelo professor?

A meu ver, a solução viável é o estímulo do educador, mostrando como a aprendizagem (aquisição de habilidades) permite solucionar problemas do dia a dia, o conhecimento necessita de ter uma significação no cotidiano e tem, importa compreender como cada coisa que ensinamos tem seu significado na vida e nos ajuda a resolver questões. O que ensinamos e aprendemos é para tornar a vida melhor. É o nosso entusiasmo de educadores é o recurso fundamental para comprometer nossos estudantes. Somos os líderes na relação pedagógica. Por último, quando propus fazer uma curva do aproveitamento dos nossos educandos numa determinada turma não foi e, a meu ver, não deve ser, para estabelecer um ranking de notas das maiores para as menores, mas sim foi para sugerir um olhar sobre a efetividade de nossa ação. A curva dos resultados pode nos mostrar como nossa atividade está sendo efetiva para todos os estudantes, ou não. Se não está, o que faremos para que venha a ser eficiente para todos? Usar a “curva de Gauss” para justificar uma “justiça” com todos os estudantes não ajuda em nada. O que ajuda é dar suporte para que cada um aprenda o mínimo necessário. Marx definiu que justiça é dar a cada um o que ele necessita. Pessoalmente, acredito que essa é mais significativa forma de justiça. Ela não decorre da comparação, do ranking, mas da necessidade. Uns necessitarão de mais cuidados e outros menos.

Cumprir isso na sala de aulas, com as carências que temos em termos de condições materiais e sociais do ensino, é difícil, bem o sei. Todavia, o caminho é esse. Poderemos executá-lo mais, ou menos, plenamente, mas, parece não haver como fugir dele. Fazer o melhor que podemos, com as parcas condições que temos. Essa é a possibilidade. Lamentar o escuro não resolve o escuro, todavia, ascender um palito de fósforo já faz alguma luz.

Grato pela sua missiva.
Um abraço e sucesso em sua vida.





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26 - Sobre Prova

Publicado anteriormente no Blog Terra, em 20 de junho de 2012


Recebi uma pergunta — "Como considera a prova?"—, cuja resposta segue abaixo.

Depende muito do que você entende como prova. Vou assumir, em primeiro lugar, que você a compreende como um teste escrito. Se for assim, ela é um instrumento de coleta de dados sobre o desempenho do educando, do ponto de vista cognitivo conceitual. Usualmente, ela é tomada como um recurso universal (válido para todas as situações), no entanto, se tomada e construída como um teste, somente serve para algumas circunstâncias, não para todas. Um instrumento só é adequado para uma realidade que o exige. Não para todas. Neste caso, tem sua validade limitada às circunstâncias que exigem esse tipo de recurso de coelta de dados. Para tanto, deverá ser elaborada segundo as regras de “elaboração de instrumentos” científicos. Hoje, em nossas escolas, esses instrumentos, falando genericamente, infelizmente, são elaborados sem esses cuidados. Todavia, se compreender prova como a prática dos exames escolares, ela será sempre inadequada, do ponto de vista da avaliação. Sobre isso, em meu site, você encontrará muitas colocações sobre os exames escolares, que poderão ser úteis em seus estudos.

Atenciosamente.

Cipriano Luckesi





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25 - Sobre o texto “Avaliação da aprendizagem: para além do autoritarismo”

Texto publicado anteriormente no Blog Terra, em 20 de junho de 2010.
Cipriano Luckesi


Recebi um pedido de esclarecimento sobre a frase — "Na prática pedagógica, a transformação da função da avaliação de diagnóstica em classificatória foi péssima" — que se encontra em meu artigo "Avaliação da aprendizagem escolar: para além do autoritarismo", publicado em 1985.

Respondi. De fato essa expressão — "Na prática pedagógica, a transformação da função da avaliação de diagnóstica em classificatória foi péssima" — não faz muito sentido. Esse texto foi escrito em 1985, há vinte e cinco anos passados. Naquele momento, eu estava dando uma virada nos diálogos sobre avaliação da aprendizagem. Esse texto foi um marco na teoria sobre avaliação da aprendizagem no Brasil. Por isso, o apuro conceitual ainda não estava suficientemente amadurecido, o que conduziu a uma expressão como essa. Certamente inadequada.

De fato, no Brasil, sempre tivemos uma atividade classificatória em relação aos estudantes individual ou coletivamente em suas turmas. Nascemos sob a égide da modernidade e a educação jesuítica — que estabeleceu essa forma de ranking — é do século XVI, e veio para cá junto com a chegada dos portugueses a essa terra, que, juntamente com negros e índios, somado aos variados povos migrantes, produziram a configuração social que temos hoje. A nossa educação formal é tingida pela educação constituída na modernidade.

A educação escolar moderna emergiu sob a égide da classificação. A compreensão da avaliação como diagnóstico e, se necessário, a intervenção, é de 1930 para cada. Foi Ralph Tyler que, em 1930, nos USA, cunhou o termo avaliação da aprendizagem, tendo em vistadesignar a sua proposta de ensinar, diagnosticar e, se necessário, corrigir. No Brasil, começamos a atinar com esse conceito só a partir de 1970, aproximadamente. E ainda não conseguimos — como pais — assimilá-lo em nossas práticas diárias.

 Hoje, entendo que temos dois tipos de avaliação: de produto [certificação --- por exemplo, a certificação ISO para empresas e empreendimentos, a certificação profissional (médicos, advogados...], entre outras; afinal a certificação da qualidade de alguma coisa já concluída; de acompanhamento (investigação — diagnóstico — dos resultados enquanto estão sendo produzidos, tendo em vista sua correção, caso necessário — acompanhamento).

A classificação depende da decisão de estabelecer um ranking, que, por si, não pertence à avaliação. É uma decisão externa às práticas avaliativas. Por exemplo, as diversas práticas avaliativas sistêmicas do país — Prova Brasil, Enem, SINAES — não têm nenhuma necessidade de estabelecer rankings, mas infelizmente estabelecem, cujo efeito, a meu ver, é negativo, do ponto de vista social e cultural. Bastaria saber que determinada escola, estado, município está tendo um desempenho satisfatório ou insatisfatório na educação. Bastaria isso e, a partir daí, tomar as decisões necessárias. O ranking (classificação) serve exclusivamente para a concorrência social. O mesmo se dá na sala de aulas.

Acredito que, na época da escrita desse texto, o que eu desejava expressar com a frase — citada por você — era a distorção que vim a perceber mais tarde de que a educação no Brasil mudou o nome de “exames escolares” para “avaliação da aprendizagem”, mas não mudou a prática, ou seja, passamos a usar uma expressão “diagnóstica”, mas permanecemos com uma prática “classificatória”; daí a expressão — transformação da função da avaliação de diagnóstica em classificatória.
  
Fico por cá, esperando ter ajudado a compreender o que me fora solicitado.


Cipriano Luckesi





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24 - Como praticar a avaliação da aprendizagem

Texto pulicado anteriormente no Blog Terra, em 19 de junho de 2010.
Cipriano Luckesi


Recebi um conjunto de perguntas de uma estudante universitária, dizendo-me que seu professor solicitou-lhe que estudasse todos os textos deste blog e, a seguir, fizesse um conjunto de questões que seriam remetidas a mim. Se eu as respondesse, deveria levar as respostas para a sala de aulas. Se eu não respondesse, deveria, do mesmo modo, levar para a sala de aulas, a tarefa que ele havia solicitado, que era "formular perguntas a partir dos estudos dos artigos deste blog".

Respondi as questões que me remeteu e as respostas encontram-se abaixo e auxiliam no entendimentos de variados pontos sobre avaliação da aprendizagem. Fico agradecido pela iniciativa desse professor, assim como de sua estudante, pois que me possibilitou oferecer a todos os frequentadores deste blog alguns entendimento específicos e importantes. Perguntas feitas e respostas:

1º -  Na sua opinião qual é a melhor, se houver uma forma de se medir, forma de se avaliar o nível de conhecimento de um aluno?

 Não existe, em abstrato, a melhor forma de coletar dados (mensurar) sobre a aprendizagem dos educandos. Em qualquer investigação — e a avaliação é uma forma de investigação —, os recursos técnicos de coleta de dados (instrumentos) são definidos e configurados segundo a necessidade do objeto de pesquisa com os qual se trabalha.

O instrumento de coleta de dados é específico e, para ser efetivo, só pode ser dessa forma. É o objeto que exige o instrumento e não o investigador que o inventa a seu bel prazer. As características do objeto e dos dados que se deseja coletar são a base da decisão sobre o instrumento a ser utilizado.

 Vamos exemplificar; para saber se um estudante apropriou-se dos conceitos das modalidades de nado, pode-se utilizar de um teste escrito; todavia, para saber se sabe nadar segundo os determinados nados, haverá que observá-lo, diretamente, nadando em uma piscina ou num lago, ou coisa semelhante. Repito, para cada objeto de investigação, há que se adequar o instrumento que colete os dados que se necessita. Ou seja, não há um instrumento universal para praticar a coleta de dados em avaliação da aprendizagem, como não há um instrumento universal para coletar dados no campo da ciência ou das várias ciências. Um instrumento inadequado distorce a realidade e, desse modo, distorce também o conhecimento que se busca.


2º - A mais tradicional e conhecida e a prova escrita. Este tipo de avaliação,na sua opinião, ainda é um método eficaz ou há a necessidade de utilizar métodos mais modernos de avaliar para acompanhar a modernização da sociedade?

 O que denominamos de “prova”, de fato, é um “teste de conhecimentos”. O que ocorre é que na história da educação moderna esse instrumento foi utilizado com funções que estão muito para além da coleta de dados sobre o desempenho do educando. Ela foi e tem sido utilizada com um recurso de disciplinamento externo e aversivo sobre os educandos, através das ameaças, da elaboração distorcida de questões mais para dificultar a resposta do estudante do que para diagnosticar sua aprendizagem, além de ser utilizado como um recurso de “aprovação ou reprovação dos educandos”, o que, por muitas vezes, conduziu ao autoritarismo (tema que já abordei bastante no passado).

Caso a denominada prova seja utilizada dentro dos limites de um “teste de conhecimento” é um recurso técnico de coleta de dados sobre desempenho conceitual dos educandos, útil e interessante. Todavia, caso ela seja utilizada na modalidade historicamente tradicional — isto é, aparentemente, para diagnosticar a qualidade da aprendizagem dos educandos, mas, de fato, para o seu disciplinamento externo e aversivo —, é inadequada e insatisfatória, pois que, nessas condições distorce a realidade do desempenho do educando, o que significa não possibilitar um conhecimento adequado de sua aprendizagem e, certamente, sua reprovação.


3º - Existe uma forma diferenciada, atual e eficaz de avaliar o nível de conhecimento dos estudantes de educação física, já que é uma especialidade diferenciada no meu entender por se tratar da única categoria que realmente trabalha com a saúde?

Retomo o que disse acima. A forma adequada de coletar dados para a avaliação depende do objeto que está sendo avaliado. Não há uma forma universalmente válida, assim como para proceder diagnósticos, no âmbito da saúde, para cada campo da vida humana, exige-se um instrumento ou uma metodologia diferenciada.

 Você mesma, em algum dia, já deve ter coletado sangue para exames de laboratório. E, ao receber os resultados, deve ter verificado que aquele montante de sangue coletado serviu com matéria prima para muitas leituras bioquímicas, segundo metodologias diferenciadas.Um só recurso não dá conta de todas as necessidades de dados para estudar um determinado objeto.

 No caso do ensino-aprendizagem na escola, os instrumentos dependerão do Projeto Pedagógico, ou seja, o que se propôs e foi efetivamente ensinado e como foi ensinado. Os instrumentos acompanham o projeto de ensino, desde que o que se está avaliando, no caso da educação escolar, deveria ser os resultados do projeto de ensino, efetivamente executado. O instrumento é o recurso pelo qual o educador pede ao educando que revele se aprendeu o que ele ensinou. Somente isso. E essa forma de perguntar depende do que se deseja saber — os variados conteúdos (objetos) de avaliação.


4º - O que o Senhor acha desta forma de avaliação que o meu professor solicitou?

De fato, acredito que seu professor deu-lhe uma atividade interessante, para que você se dedicasse ao estudo do tema da avaliação da aprendizagem. Sou gato a ele e a você, como disse no início deste texto.

 Respondo. Essa atividade poderá revelar sua dedicação e seu empenho em cumprir uma tarefa proposta por seu professor, porém, não revela o que você aprendeu lendo os artigos do meu site.

 Quem está respondendo as questões que você formulou sou eu e não você. Então, eu estou revelando o que eu sei, mas você não está revelando o que aprendeu, ou seja, esse instrumento (01) não coleta os dados de sua aprendizagem sobre os conteúdos estudados no blog, mas (02) sim de seu desempenho como cumpridora de uma tarefa.

Se o objetivo era saber se você havia aprendido alguma coisa sobre avaliação, segundo os textos que estudou em meu site, esse instrumento utilizado por seu professor é inadequado e insatisfatório. Se ele desejava verificar se você era responsável em cumprir uma tarefa proposta por ele, OK, é adequado.

 Volta, então, a questão — acima tratada — de que um instrumento de coleta de dados necessita de ser adequado para “se saber exatamente o que se deseja saber”, isto é, cada objeto de estudo exige um instrumento específico de coleta de dados.

Em síntese, para saber se o recurso utilizado por seu professor foi o adequado, importa saber o que ele queria diagnosticar ao utilizá-lo. E isso, não ficou definido em sua correspondência. Pode até mesmo ocorrer que ele não tenha lhe revelado o que desejava com essa tarefa. era somente uma tarefa escolar-acadêmica.

O senso comum escolar, mais longamente arraigado em todos nós, é de que os instrumentos são universais e válidos em todos os tempos e circunstâncias, como a prova, por exemplo. E, efetivamente, nenhum instrumento é universal; cada um é elaborado com destinação própria e somente pode coletar dados específicos para essa destinação. A tradição escolar, com as denominadas provas, comete esse engano e, por isso, não pratica avaliação e, sim, exames, e ainda de forma distorcida, pois que, poe muitas vezes, as provas são construídas sem levar em conta as mínimas exigências de uma metodologia científica. E, certamente, um instrumento de coleta de dados numa prática investigativa necessita de ser construído com rigorosas regras da metodologia científica.


5º - O Senhor tem alguma dica de formas atuais de avaliação para os alunos de educação física?

 Repito o que eu disse acima, os educadores na área de educação física, como em qualquer outra área, necessitarão de ter clareza e definição precisa sobre o que desejam ensinar e, para verificar se seus estudantes aprenderam o que ensinaram, devem identificar e elaborar os instrumentos que coletam os dados específicos que estão necessitando para praticar a avaliação. O ato de avaliar, efetivamente se dá, por sobre os dados coletados.

Os dados coletados produzem uma descritiva do desempenho do educando e avaliação da aprendizagem significa atribuir qualidade a esse desempenho descrito.

Ele já é satisfatório? Se não é satisfatório ainda, o que se vai fazer? Ensinar de novo? Reprovar e excluir o educando, como fazem os exames escolares? Da avaliação decorre uma conseqüência — se necessário, a intervenção corretiva da ação, se desejamos obter os melhores resultados segundo o projeto de ensino que temos.

 Um abraço em seu professor, um abraço para você e sucesso nas atividades de estudos e aprendizagens entre vocês.

 Atenciosamente


Cipriano Luckesi




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