domingo, 29 de maio de 2016

107 - AVALIAÇÃO E AS DISTORÇÕES DA CONTABILIZAÇÃO DAS NOTAS ESCOLARES

Cipriano Carlos Luckesi
Contato --- ccluckesi@gmail.com

01. CONSTATAÇÃO
São práticas bem diferentes: de um lado, está a “prática da avaliação” como subsidiária da obtenção do melhor resultado no ensino-aprendizagem; de outro, está a “contabilização de notas”, como uma prática reificada de registros através de símbolos numéricos.

02. ATO PEDAGÓGICO
O ato pedagógico tem por objetivo garantir a aprendizagem do educando. E esta, por sua vez, é condição humana fundamental, à medida que o ser humano chega ao mundo carente de maturidade biológica, psicológica e espiritual, mas com um recurso fundamental de aprendizagem e autoformação, que é o sistema nervoso. A avaliação subsidia o educador nessa tarefa de trabalhar, tendo em vista formar o educando. Por isso, iniciamos essa abordagem sobre avaliação pela configuração do ato pedagógico. Se desejamos nos servir de forma adequado dos recursos da avaliação, necessitamos ter como pano de fundo do ato de avaliar a compreensão do ato de ensinar, pois que é a ele que a avaliação da aprendizagem subsidia.
Não há como bem compreender o ato de avaliar, caso ele não seja colocado a serviço do ato de ensinar e, para tanto, importa compreender como se processa o ensino e a aprendizagem.
O ser humano se forma, em sua personalidade e modos de ser e agir, através de aprendizagens e estas se processam através da formação de circuitos neurológicos, que se compõe através das conexões entre os neurônios, que ocorre sob a forma de rede; circuitos esses que são construídos pelo processo de ensinar e aprender.
Ensinar depende da habilidade metodológica de quem ensina, seus cuidados e paciência em dar suporte ao educando para que aprenda; e, de outro lado, aprender depende da compreensão e exercitação dos conteúdos por parte do educando. Essa exercitação depende de orientação e acompanhamento por parte do educador.
Se o educando já tivesse a posse dos conhecimentos e habilidades que são oferecidos à aprendizagem na escola, não necessitaria de vir para esse espaço, como também não necessitaria da assistência do educador. Contudo, à medida que busca a escola para “aprender”, desde que essa é a sua finalidade, importa que o educador, que representa essa instituição no espaço da sala de aula, cuide desse educando, pacientemente, ensinando-o e reensinando-o, até que aprenda aquilo que deve a aprender.
Não há possibilidade de um educando aprender com “uma aula dada”; necessita “ser ensinado”, o que implica:
(01) na “exposição” de um conteúdo,
(02) na sua “compreensão” (exige que o educador esclareça o educando, o quanto for necessário, para que compreenda o conteúdo exposto),
(03) na “proposição e orientação de exercícios”, que possibilitem o entendimento e, ao mesmo tempo, a constituição do domínio sobre o conteúdo em estudo e aprendizagem,
(04) em experiências de “aplicação” do conteúdo aprendido em situações da própria matéria cognitiva em estudo, da vida em geral e do cotidiano, o que permite aprender que aquilo que está sendo ensinado e aprendido na escola faz sentido na vida,
(05) em experiências de “recriação” do conteúdo ensinado, tendo em vista o estudante perceber que, após, apropriar-se de um determinado conteúdo, pode prosseguir, indo para além daquilo que recebeu como herança do ensino decorrente da cultura já elaborada.
A avaliação é o recurso que auxilia o educador a tomar consciência e, consequentemente, tomar decisões sobre sua prática de ensino, tendo em vista garantir que todos os seus estudantes aprendam aquilo que devem aprender, tendo por base o currículo escolar, traduzido em plano de ensino para a sala de aula.

03. O ATO DE AVALIAR
O ato de avaliar é parceiro do processo de ensinar e aprender. Existe para auxiliar o educador a atingir o sucesso em seu ato de ensinar; como também acontece em todos os atos do ser humano. No caso do ato de ensinar, sucesso significa que o estudante aprendeu plenamente aquilo que fora ensinado.
O ato de avaliar existe, como em todo e qualquer ato humano, para “revelar” se o resultado, obtido pela ação realizada, já atingiu o resultado desejado ou não. Em caso positivo, ótimo; em caso negativo, investir mais até que o resultado desejado seja obtido. É dessa forma que agimos em todos os nossos investimentos para conseguir um resultado positivo para nossa ação.
Todavia, na educação escolar, temos, por hábito inconsciente, não atuar dessa forma, ou seja, usar o ato de avaliar para verificar a qualidade do resultado de nossa ação e, se necessário, investir mais e mais até obter o resultado desejado.
Avaliar, de fato, é o ato de investigar a qualidade da realidade; e, como ato investigativo, deve revelar a qualidade da realidade; fator que oferece base objetiva para uma tomada de decisão sobre a realidade avaliada.
Caso, a qualidade da realidade investigada revele-se positiva, ótimo; caso seja negativa, temos duas possibilidades: (a) “deixar as coisas como estão”, (b) “investir mais e mais até que o resultado de nossa ação atinja a qualidade desejada”.
Desse entendimento, facilmente se deduz que o ato de avaliar é subsidiário do “sujeito” que age, no caso como educador. A avaliação só tem por função subsidiar o sujeito da ação; ela não existe, pois, independente do projeto de ação. Quem decide a respeito de uma intervenção no curso de uma ação é o gestor, não o avaliador.
Na prática pedagógica em sala de aula, gestor (educador) e avaliador são papéis exercidos pelo do mesmo personagem (o professor) mas importa estar atento ao fato de que são atos distintos. Ensinar é um ato de produzir a aprendizagem; avaliar é o ato de saber se a qualidade do resultado obtido com a ação de ensinar, já é satisfatório. Avaliar, afinal, está a serviço do ato de ensinar.

04. CONFUSÃO EPISTEMOLÓGICA ENTRE AVALIAÇÃO E REGISTRO DA QUALIDADE DA APRENDIZAGEM
A qualidade do desempenho do estudante em sua aprendizagem, na escola, socialmente necessita ter um “registro” do testemunho do educador de que ele trabalhou com estudante e este se habilitou nos conteúdos ensinados. É o registro de que o educador acompanhou o estudante e ele “aprova” seu desempenho.
Pela escola, passam tantos estudantes ao longo do tempo. Tendo em vista garantir, social e historicamente, a memória dessa passagem eficiente pelas aprendizagens escolares, a instituição escolar necessita proceder um registro de que um determinado estudante foi cuidado nessa escola e aprendeu aquilo que deveria ter aprendido, em relação ao currículo estabelecido, tendo presente sua idade e seu nível de desenvolvimento.
Esse registro da qualidade da aprendizagem do estudante, ao longo do tempo sofreu modificações. No século XVI, registrava-se “promovido”, “não promovido”, havendo ainda a possibilidade do “mediano”. Contudo, acreditava-se que a qualidade “mediana” era uma qualidade duvidosa, por isso, o estudante, ao qual era atribuída essa qualidade, tinha o direito de frequentar as aulas da classe subsequente, mas não era matriculado nela. Caso sustentasse as aprendizagens dessa classe, então, era matriculado na mesma; caso manifestasse dificuldades para acompanhar essa classe, retornava a anterior.
A partir do século XIX, em muitos países, inclusive no Brasil, o registro do “testemunho” do educador de que acompanhou determinado estudante em suas aulas e ele “aprendeu” o necessário passou a ser registrado por “símbolos numéricos”, usualmente numa escala de 0 (zero) a 10 (dez).
Esses símbolos numéricos, que são “registros de qualidade”, sofreram uma “reificação”, ou seja, de símbolos numéricos transformaram-se indevidamente em realidades quantitativas. Reificar --- no caso no âmbito que estamos tratando --- significa transformar “qualidade” em “quantidade”; um recurso epistemológico indevido. Sem mais nem menos, os símbolos numéricos, utilizados como recursos de “registro da qualidade” da aprendizagem dos estudantes, ganharam a realidade de “quantidades”. Esse fenômeno trouxe, e ainda traz, consequências negativas para o cotidiano escolar, como vertemos.

05. CONTABILIZAÇÃO DA APRENDIZAGEM
Com a solução de registrar a “qualidade do resultado” da aprendizagem do estudante através de “símbolos numéricos”, emergiu uma nova prática --- a prática das médias de notas ---, acreditando-se que os símbolos numéricos, no caso, significam quantidade e, de fato, eles expressam somente o uso de “símbolos numéricos para registrar uma qualidade”; aquilo que era recurso simbólico de registro da qualidade da aprendizagem do estudante passou a ser assumido “como quantidade de aprendizagens”.
Esse “contrabando” entre qualidade e quantidade trouxe consequências negativas para a prática pedagógica escolar. Ao invés de se investir em aprendizagem, passou-se a investir na obtenção de notas escolares. Mesmo que o estudante não tenha aprendido de modo satisfatório aquilo que deveria aprender, caso obtenha notas escolares suficientes (mesmo que seja pela burla da “cola”), ele é considerado aprovado em sua aprendizagem. A efetiva aprendizagem torna-se desconsiderada frente à nota.
Ou seja, o que passa a ser significativo é o registro (a nota) e não a efetiva aprendizagem. Então, pais, professores, estudantes, assim como os gestores do sistema de ensino passaram a observar e valorizar os registros e não os desempenhos dos estudantes.

06. CONTABILIZAÇÃO DA APRENDIZAGEM ATRAVÉS DAS MÉDIAS DE NOTAS
Sustentadas no contrabando entre qualidade e quantidade pelo uso dos símbolos numéricos para registro da qualidade dos resultados da aprendizagem dos estudantes, emergiram as “médias de notas”.
À semelhança do contrabando entre qualidade e quantidade, que constitui um engano epistemológico, as médias de notas seguem o mesmo caminho, constituem um engano no que se refere à qualidade, no caso, da aprendizagem dos educandos.
Um exemplo demonstra esse fato de modo cristalino. A um estudante foi ensinado o conteúdo da “adição” e sua aprendizagem a respeito desse tópico de conteúdo aritmético foi plenamente satisfatório. Utilizando o sistema de “notas escolares” (= registro da qualidade de desempenho através de símbolos numéricos), essa aprendizagem é registrada com o símbolo numérico “10” (dez), que, então, deixa indevidamente de ser registro de qualidade para ser quantidade de aprendizagem.
De forma semelhante, esse mesmo estudante foi submetido ao ensino-aprendizagem do conteúdo “subtração” e, nesse conteúdo, ele apresentou um desempenho insatisfatório e essa qualidade foi registrada com o símbolo numérico “2,0”, que, pelo mesmo desvio epistemológico, deixa de ser registro de qualidade e passa a ser uma quantidade.
Então, como essa transposição de registro de qualidade para quantidade, é possível praticar e obter a média entre as duas notas. Fazendo-se a média entre elas, como usualmente ocorre prática em nossas escolas, teremos 10+2,0 = 12,0, que é dividido por 2, = 6,0.
Nessa circunstância, pela média de notas, a aprendizagem do estudante está aprovada, desde que lhe foi atribuída uma nota acima 5,0 (cinco) necessária para a aprovação, em nosso meio escolar.
Nessas condições, o estudante está aprovado, desde que sua média de notas permite isso, porém, os dados do seu desempenho revelam que só aprendeu a adição de modo satisfatório. No entanto, a média “6,0” está a afirmar que aprendeu satisfatoriamente tanto adição como subtração, o que é um engano, desde que só aprendeu adição.
Em síntese, o contrabando epistemológico indevido que se pratica, de modo aparentemente imperceptível, entre qualidade e quantidade, por meio do registro dos resultados escolares através de símbolos numéricos, possibilita uma segunda distorção que se expressa pela contabilização das notas, produzindo as médias de notas, que, por si, não tem como expressar a realidade da aprendizagem dos estudantes.
Um conceito que não tem base na realidade foi denominado por Marx de “fetiche”. O que é um fetiche? Alguma coisa que “parecer que é”, porém, “não o é” e que, dessa forma, nos enfeitiça, não nos permite ver a realidade como ela é, por isso, nos engana.

07. CONTABILIZAÇÃO DA APRENDIZAGEM ATRAVÉS DOS CONCEITOS
Mais estranha é a “contabilização” que se pratica com “os conceitos”, que se referem a registros da qualidade da aprendizagem dos estudantes, praticados por meio de letras, tais como A, B, C, D, E, F, ou por meio de adjetivos, tais como inferior, médio, médio superior, ótimo. O objetivo dessa forma de registrar os resultados da aprendizagem emergiu em nosso meio, tendo em vista superar os desvios decorrentes das notas escolares.
Para exemplificar, citarei o caso da Universidade Federal da Bahia, onde trabalhei como professor por mais de trinta anos. Ela é somente um caso, desde que muitas instituições seguiram o mesmo caminho.
Logo após a Reforma Universitária, promovida pela Lei 5.540, de 1968, o aproveitamento dos estudantes era registrado, nessa instituição, por conceitos representados por símbolos alfabéticos, como se segue: SR = sem rendimento; IN = inferior; MI = médio inferior; ME = médio; MS = médio superior; S = superior.
Com o passar dos anos, essa forma de registro do aproveitamento dos estudantes voltou a ser por símbolos numéricos. E a razão desse retorno fora muito simples: todos os professores e o próprio sistema serviam-se de uma equivalência entre “letras”, que representam os conceitos qualitativos obtidos pelos estudantes, e “números”, que se estendiam de zero a cinco. Então, à medida que o que era praticado como forma de registro, de fato, eram os números numa escala de 0 (zero) a 5,0 (cinco), retornou-se para o velho modo de registro com notas de 0 (zero) a 10 (dez).
O que ocorria com o uso dos denominados conceitos? Novamente um contrabando entre qualidade (conceito) e quantidade (valores numéricos). Então, praticava-se a seguinte correspondência entre conceitos e valores numéricos: SR = 0 (zero), IN = 1,0, MI = 2,0, ME = 3,0, MS = 4,0, S = 5,0.
Com esse procedimento de equivalência entre letras e quantidades, subsidiava-se a contabilização, que ocorria com o registro dos resultados escolares exclusivamente através de símbolos alfabéticos, que, de fato, eram numéricos. Novamente qualidades (representadas pelas letras) transpostas para quantidades correspondentes (de 0 a 5,0).
Desse modo, um estudante que havia obtido o conceito “IN” em um determinado conteúdo e, a seguir, obtinha um conceito “S” em outro conteúdo --- ou até mesmo no mesmo conteúdo --- da mesma disciplina de estudos, tinha o registro de seu aproveitamento como sendo “ME” (= médio).
Observar que, nessa circunstância, à medida que era “impossível” proceder uma contabilização de médias entre letras, que representavam conceitos, praticava-se sua “conversão para números” e, então era viável proceder médias e, a seguir, novamente retornar às letras, tendo em vista registrar os conceitos nas cadernetas acadêmicas e nos documentos oficiais da instituição, desde que a modalidade de registro era por conceitos simbolizados por letras.
Ou seja, os conceitos, através de letras, que deveriam ser representações de qualidades, eram convertidos --- através de uma convenção, previamente estabelecida --- em números, desde que estes permitiam proceder a contabilização das médias e, a seguir, novamente --- pela mesma convenção ---, as médias eram convertidas em letras, meio pelo qual o desempenho do estudante era registrado.
Afinal, uma nova contabilização fetichicizada, desde que seu modo de operar está descolado da qualidade da aprendizagem do estudante; uma pura operação numérica convencional e abstrata, sem sustentação em dados da realidade.
O mesmo pode ocorrer, quando se usa adjetivos para registrar qualidades do desempenho do estudante, à media que, pelo senso comum, que atravessa a vida escolar, também os adjetivos --- convencionalmente --- serão traduzidos em números, que possibilitam médias e, a seguir, o retorno aos adjetivos.
E, para além de tudo isso, ainda importa saber se os recursos utilizados para coleta de dados a respeito do desempenho do estudante eram satisfatórios, metodologicamente falando. Uma outra área da avaliação que merece cuidados.

08. QUAL A POSSIBILIDADE DE AGIR DE OUTRO MODO?
A resposta a essa questão vem de imediato: atuar tendo como objetivo do ensino “produzir uma aprendizagem satisfatória” e não uma “nota satisfatória”. A nota será a forma de registro do testemunho oficial do educador de que investiu e o estudante aprendeu aquilo que deveria aprender. O registro representará simplesmente que o estudante atingiu a aprendizagem satisfatória necessária no determinado conteúdo que está sendo ensinado, nada mais que isso.
Essa compreensão implicará que o educador trabalhará para que “cada um e todos os estudantes” de uma turma aprendam “o necessário” dos conteúdos estabelecidos no currículo acadêmico, traduzido em plano de ensino. Alguns estudantes poderão adquirir um desempenho “para além do necessário”, serão brilhantes, mas “todos” deverão atingir a aprendizagem do necessário. Isso não significará “media de notas”, mas a aprendizagem necessária.
Em 1984, por oportunidade de um Congresso entre educadores, desafiando todos nós --- a mim também --- para o estudo da distorção presente nas “médias de notas” usei a seguinte situação: “Sou professor de uma Escola de Pilotagem de aviões comerciais. Um estudante obteve as seguintes notas nas unidades de ensino: (01) decolar o avião, nota 10; (02) viagem de cruzeiro, entre um aeroporto e outro, nota 6,0; (03) pouso do avião, nota 2,0. Média entre as notas obtidas: 10+6,0+2,0 = 18,0, que, dividido por 3, chega-se  à média 6,0. Portanto média de aprovação, desde que está acima do 5,0 exigido. Vocês viajariam com esse piloto?”
Todos riram e, com um meneio de cabeça, diziam: “Está doido?” Ninguém de nós, em sã consciência, viajaria com esse piloto, desde que seria morte certa. Todavia, promovemos estudantes em nossas salas de aula com médias de notas semelhantes a essas.
O raciocínio mais comum será: “Mas, caso o estudante não tenha aprendido suficientemente bem adição, não haverá um desastre tão grandioso como o relativo à queda de um avião”. Aparentemente, não; contudo, na realidade, o estudante, que só aprendeu adição e não aprendeu subtração, terá que prosseguir na vida escolar e na vida pessoal, com uma carência de conhecimentos, que lhe é devida pela escola, desde que ele foi lá para aprender.
Então, para sair de quadro, a possibilidade não é o uso da contabilização, seja de notas escolares, seja de conceitos, mas sim ensinar com tal cuidado com cada um, e todos os estudantes da turma, de tal forma aprendam o necessário, curricularmente estabelecido e traduzido em planos de ensino para a sala de aula. No caso da formação do piloto de aviação comercial, ele teria aprendido o suficiente tanto na decolagem da aeronave, quanto no voo de cruzeiro; como também no seu pouso. Ou, em outros exemplos, utilizados neste texto, o estudante teria aprendido, suficientemente bem tanto adição como subtração.
Nesses, como em outros casos, a aprovação do desempenho adquirido pelo estudante deveria vir da sua aprendizagem satisfatória dos conhecimentos e habilidades ensinados e aprendidos, e, não em decorrência de uma “média de notas”, que usualmente são enganosas.
Só pelo desempenho satisfatório em todos os conteúdos necessários, ensinados e aprendidos pelo estudante, poderia vir a aprovação do resultado do nosso trabalho de educadores em sala de aula.
 Certamente que nossa primeira reação à essa proposição será dizer; “Impossível. Impossível que todos os estudantes aprendam com equivalente nível de qualidade”. Produzir esse resultado certamente será trabalhoso, mas não impossível. Para tanto, importa servir-se da compreensão a respeito do ato pedagógico, exposto no início deste texto.
Vale a pena tentar.

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Caso o leitor esteja interessado em aprofundar esse conteúdo, publiquei um livro que se intitula “Sobre Notas escolares: distúrbios e possibilidades”, editado pela Cortez Editora, São Paulo, 2014. Ou poderá ainda consultar no livro de minha autoria “Avaliação da aprendizagem: componente do ato pedagógico”, publicado pela Cortez Editora, São Paulo, 2012, o Capítulo II, da 3ª  Parte, intitulado “Catado: questões variadas em torno da avaliação da aprendizagem e da educação”, onde, entre os variados temas abordados, encontra-se: “Notas na escola”, à página 406.






quinta-feira, 26 de maio de 2016

106 - APROVAR NA PRÁTICA EDUCATIVA ESCOLAR: SENSO COMUM E SENSO CRÍTICO

Cipriano Luckesi


SENSO COMUM. Nas conversas diárias e habituais no contexto escolar, e, pois, no âmbito do senso comum, o termo “aprovação” --- que tem seu correlato em “reprovação” --- está comprometido com a ideia de promover um estudante, comumente de uma série para outra, frente ao conjunto de acertos que teve em uma prova, uma redação, um relatório, ou coisa semelhante.


SENSO CRÍTICO. “Aprovar”, no entanto, no âmbito de um olhar crítico, significa que consideramos que uma determinada realidade apresenta a qualidade “satisfatória”. Nesse contexto, no cotidiano, dizemos: “aprovo sua conduta”, “aprovo o sabor desta comida”, “aprovo a solução que você encontrou para a situação problemática que estávamos vivendo”, “aprovo a roupa que você fez para mim”, “aprovo a turnê que você escolheu para nossa viagem”, “aprovo a roupa que você escolheu para se fazer presente na festa de formatura de nossos estudantes”... e, dessa forma, por diante.

Então, “aprovar” significa dizer que: (01) “investigamos a qualidade de alguma coisa (ato, produto, resultado de uma ação)” e, a seguir, (02) “com base no resultado dessa investigação”, (03) “emitimos nosso parecer de que a qualidade dessa realidade é satisfatória”.

Nos projetos de ação, esse parecer de aprovação decorre do nosso investimento sucessivo até obter o patamar de satisfatoriedade naquilo que colocamos como nosso objetivo, definido no momento em que decidimos “fazer alguma coisa” (agir).

Quando temos um projeto de ação, não apostamos num resultado insatisfatório ou médio; desejamos e investimentos no melhor resultado ou no resultado perfeito. Para isso, dispomos de um projeto e praticamos sua execução de forma controlada.

Por exemplo, o diretor de uma peça teatral não desiste dos ensaios com seus artistas enquanto eles não apresentam um desempenho plenamente satisfatório (seu objetivo); um, cozinheiro não desiste da preparação do prato de alimento que está elaborando, enquanto ele não chega ao ponto de sabor e cozimento (seu objetivo); uma costureira não desiste da roupa, que está costurando, enquanto ela não adquire a qualidade de perfeição e beleza desejada (seu objetivo); e, assim, todos os atos na vida humana. Desse modo, em todos os atos da vida humana, buscamos construir o melhor e o mais satisfatório resultado. “Aprovamo-lo” quando atingimos esse patamar de qualidade. Apostamos no sucesso e, por isso, investimos em sua busca.

Porém, na escola, não temos o hábito de apostar no sucesso, assim como não mantemos o hábito de, para nele chegar, investir... investir... investir. “Damos aulas” e esperamos que os resultados sejam positivos. “Dar aula” é diferente de “ensinar”. “Dar aula” equivale a “jogar sementes ao vento”; “ensinar” equivale a cuidar para que se aprenda. No caso, “damos aulas” e “esperamos” que nossos estudantes tenham aprendido. Usualmente, “esperar” não se revela uma boa estratégia para se chagar a resultados desejados.

É comum, em nosso cotidiano, que, ao final de um período de atividades pedagógicas escolares, através de testes (nem sempre elaborados com o rigor metodológico necessário), procuramos saber se os estudantes aprenderam aquilo que apresentamos em nossas aulas. Caso nossos estudantes manifestem não ter aprendido, os “reprovamos”.

Essa conduta de “reprovar”, em princípio, significaria que nossos estudantes --- mesmo com todo nosso investimento --- não aprenderam aquilo que ensinamos. Então, cabe a pergunta: “Será que investimos e reinvestimos na construção da aprendizagem de nossos estudantes?

Caso revelem que não aprenderam --- e desejamos que eles aprendam ---, não há outro caminho a não ser investir mais, desde que esse é o padrão geral da conduta humana: agir, avaliar e reinvestir até chegar ao resultado desejado, isto é, ao resultado “aprovado”.


CONCLUINDO. Então “aprovar um resultado”, no caso dos projetos de ação, significa “construir um resultado” plenamente aceitável, do ponto de vista de sua qualidade. De forma alguma, significa “esperar” que o resultado positivo chegue. Não. Ele não chega, à media que depende de investimento.

O “aprovado” não é dado, é “construído” e isso, no caso humano, tem mais a ver com “quem constrói” do que com “quem é construído”. Nós educadores somos gestores da aprendizagem de nossos educandos. Para isso servem os recursos metodológicos.


O convite é: “construir a aprovação”, como se constrói em todos os outros atos cotidianos do ser humano.






terça-feira, 17 de maio de 2016

105 - AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM: SENSO COMUM E SENSO CRÍTICO


Cipriano Luckesi
Contato --- ccluckesi@gmail.com


01. O SENSO COMUM: o que “parece” ser o ato de avaliar


Ao usar a expressão “avaliação da aprendizagem”, pelo senso comum que construímos a respeito dessa atividade pedagógica no seio da escola, de imediato, emerge em nossas mentes: “provas”, “testes”, “notas”, “média de notas”, “aprovação”, “reprovação”, que “estudantes já não estudam mais como antigamente”, “no meu tempo, que era difícil, agora....” e, por aí se vai. Nossa mente está eivada dessas expressões que salta à nossa frente quando utilizamos ou ouvimos a referida expressão.


02. O SENSO CRÍTICO: o que “é” o ato de avaliar


Todavia, nenhuma dessas expressões tem a ver, direta e essencialmente, com avaliação da aprendizagem. Essas imagens que nos vem à mente, quando ouvimos, lemos ou utilizamos a expressão “avaliação da aprendizagem”, podem ter, e certamente tem, alguma relação com avaliação da aprendizagem, mas não a define nem a configura em seu papel válido e necessário nos procedimentos avaliativos do desempenho do estudante.

As imagens e ideias, acima citadas, sobre avaliação da aprendizagem emergem intempestivamente em nossa consciência, como se fossem a última expressão de validade no que se refere ao ato pedagógico de avaliar o desempenho dos estudantes em sua aprendizagem. No entanto, toda a fenomenologia, atrelada a essas expressões, não expressam, de forma alguma, o conceito epistemológico e válido do que é avaliar.

Elas são expressões que, ao longo do tempo --- pelo menos com a duração dos cinco séculos de existência da educação escolar, como a conhecemos hoje --- ganharam foros de validade e, por isso, de expressão do que praticamos ou do que devemos praticar na condição de educadores escolares.

Avaliar significa tão somente “investigar a qualidade da realidade”. A ciência, como investigação, busca revelar “como a realidade funciona”; a avaliação, também como investigação, busca revelar a “qualidade da realidade”. Ambas necessitam de dados descritivos da realidade, que garantam a validade e a sustentação de suas revelações, assim como ambas fazem uma leitura da realidade, uma sob o foco do seu funcionamento e a outra sob o foco de sua qualidade.

Em nenhuma dessas atividades investigativas, a opinião emocional e valorativa pode garantir a efetiva validade de sua revelação. Como ambas são investigações, elas sustentam-se em dados que descrevam, seja o funcionamento da realidade (ciência), seja a base para que se possa atribuir qualidade à realidade (avaliação); ambas, pois, assentadas sobre as características da própria realidade.

Os resultados da ciência subsidiam as proposições e encaminhamentos de tecnologias que possam garantir melhores, mais adequadas e mais saudáveis formas de cuidar da vida. Os resultados da investigação avaliativa, por sua vez, subsidiam novas e mais adequadas decisões tendo em vista conquistar resultados satisfatórios em decorrência dos investimentos da ação humana.

O ato de avaliar é, desse modo, um ato de diagnosticar a realidade, do ponto de vista qualitativo, e, dessa forma, subsidiar novas e adequadas decisões, tendo em vista atingir resultados necessários e desejados.

Aplicando essa compreensão à avaliação da aprendizagem, pode-se facilmente compreender o ato de avaliar a aprendizagem dos estudantes, para ser efetivamente avaliação, deve estar comprometida com (01) dados da realidade e, em segundo lugar, como investiga a qualidade da realidade, (02) necessita proceder uma comparação da realidade descrita com um critério de qualidade, considerado como válido, no contexto do fenômeno em torno do qual está ocorrendo a avaliação.

No caso do ensino-aprendizagem na escola, esse critério de qualidade está configurado no currículo escolar, no projeto pedagógico da escola, assim como no plano de aula do professor. Eles determinam o que e como ensinar, a fim de que a aprendizagem se dê de modo satisfatório.

De fato, do ponto de vista da avaliação da aprendizagem, um educador escolar necessita diagnosticar (= conhecer através de dados) se o seu educando aprendeu aquilo que devia aprender e com que qualidade; informação que só o ato avaliativo pode oferecer. Com esse dado em mãos, pode tomar decisões do que fazer: (01) em caso de identificar o não atendimento dos objetivos desejados, retomar o ensino de um conteúdo até que todos os estudantes manifestem ter aprendido (= não se esquecer que o objetivo da escola é ensinar para que “todos” aprendam); (02) prosseguir, mesmo que os estudantes não tenham aprendido (= abrindo mão do objetivo da escola, baseada no “ensino simultâneo” de que todos aprendam o necessário). Não é a avaliação que decide; quem decide é o educador que avalia. A avaliação somente subsidia sua decisão.

Sem essa compreensão crítica, consistente, o entendimento da avaliação retorna ao senso comum, tratando a avaliação com base em informações paralelas, que efetivamente, em essência, não tratam da avaliação da aprendizagem.



03. COMO AS EXPRESSÕES DO SENSO COMUM PODEM SER COMPREENDIDAS PELO SENSO CRÍTICO



Retomemos as expressões citadas no início deste texto frente à compreensão epistemologicamente válida do ato de avaliar: “provas”, “testes”, “notas”, “média de notas”, “aprovação”, “reprovação”, que “estudantes já não estudam mais como antigamente”, “no meu tempo, que era difícil, agora....”


PROVAS é uma denominação usada comumente, através do tempo, chegando hoje a ser confundida com o ato de avaliar na vida escolar, mesmo porque a ideia de avaliação emergiu nos anos 1930, com Ralph Tyler, nos Estados Unidos e a ideia de provas emergiu já a partir do século XVI, com as denominadas pedagogias tradicionais.

De fato, as “provas” são somente um recurso de “coleta de dados” sobre desempenho do estudante, se elaboradas e utilizadas com essa intenção.

No contexto desse entendimento crítico, as “provas” perderão a conotação comum e presente no cotidiano da vida escolar de que elas avaliam; e, então, se o desejarmos, poderemos continuar a nos servir dessa denominação, porém cientes de as “provas” compõem exclusivamente um recurso técnico de coleta de dados sobre o desempenho do estudante, tendo em vista subsidiar a prática da avaliação, que é a “qualificação da realidade”, com base nesses dados coletados e comparados a um padrão desejado de desempenho.


 TESTES, por si, não expressam o ato de avaliar. Simplesmente são recursos técnicos de coleta de dados, com a mesma função indicada no item anterior para as provas. Os dados coletados sobre o desempenho dos estudantes pelos testes subsidiam o ato avaliativo, que é a atribuição de qualidade à realidade, com base em suas características de realidade.


NOTAS não são dados reais a respeito do desempenho conquistado pelos estudantes, como assumidas pelo senso comum. Elas expressam formas de “registros” da qualidade do desempenho do estudante. As notas “representam simbolicamente o testemunho dos educadores de que eles ensinaram e os estudantes aprenderam aquilo que deveriam aprender”.

Nota 10 (dez) não representa uma quantidade 10 de conhecimentos; simplesmente representa que o estudante “aprendeu brilhantemente” aquilo que lhe fora ensinado; nota 8 (oito) pode, por exemplo, representar a qualidade do estudante que aprendeu o necessário que deveria aprender. Os registros dependem de convenções assumidas como expressão de alguma coisa. No caso, elas “representam” a qualidade; contudo não são a qualidade da realidade.


MÉDIA DE NOTAS. Notas escolares representam a “qualidade” e não a “quantidade” das aprendizagens por parte dos estudantes. As médias entre notas escolares expressam uma distorção epistemológica, ou seja, não cabe proceder média entre notas escolares, desde que elas não expressam a “quantidade” da realidade da aprendizagem dos estudantes, mas sim sua “qualidade”.

Tendo em vista perceber claramente essa distorção, basta uma simulação. Vamos supor que a um estudante, matriculado nas séries iniciais do Ensino fundamental, foi ensinado o “raciocínio e as práticas aditivas” e ele obteve a nota 10 (dez) no conteúdo “adição” com base em seu desempenho, desde que aprendeu brilhantemente a adicionar; contudo na aprendizagem da “subtração”, ele teve um desempenho insatisfatório e obteve a nota 2 (dois).

Na média (10+2 = 12 e 12/2 = 6), ele está aprovado, desde que sua “média” é superior à nota 5 (cinco), usualmente assumida em nossas escolas como padrão de promoção. Todavia, a “média de notas”, do ponto de vista da “realidade da aprendizagem” não representa aquilo que efetivamente o estudante aprendeu. Na situação citada, ele só aprendeu adição, não aprendeu subtração, mas está aprovado “tanto em adição como em subtração”, com base na média de notas. As notas simplesmente são símbolos numéricos que registram a qualidade da aprendizagem dos estudantes, por isso, não comportam médias. Ainda que histórica e praticamente sejam utilizadas no cotidiano escolar, são indevidas.

Se alguém estiver interessado na compreensão epistemológica das notas, assim como de suas distorções, poderá consultar o livro que publiquei sobre essa temática, que se intitula “Sobres notas escolares: distúrbios e possibilidades”, Cortez Editora, São Paulo.


APROVAÇÃO/REPROVAÇÃO. Os conceitos de aprovação/reprovação implicam que existe um “sujeito” (no caso, o educador, a educadora) que, com base nos dados coletados sobre o desempenho dos estudantes e da qualificação de seus desempenhos, toma a decisão de promovê-los de uma série para a outra. Não são os atos praticados no processo avaliativo que aprovam ou reprovam, mas sim o educador ou a educadora que, com base nos dados da realidade de sua aprendizagem, decide aprova-los ou reprova-los.

Por muitas vezes, os educadores assumem que são os recursos da prática avaliativa que aprovam/reprovam os estudantes. De fato, a decisão de promoção, ou não, de um ou de vários estudantes decorre do educador/a. No caso, os recursos subsidiam a decisão; contudo, a decisão é do sujeito que educa.

Vale ainda observar que nós educadores deveríamos investir em nossos educandos até que eles manifestem as qualidades necessárias da aprendizagem nos conteúdos que ensinamos (conhecimentos, habilidades e atitudes). Dessa forma, todos seriam promovidos, característica própria do ensino simultâneo (todos aprendem), assim como dos desejos filosóficos da educação escolar a serviço da equalização social, ou seja, se todos aprendem igualmente o necessário, todos têm condições de buscar o seu lugar ao sol. Nesse caso, o registro do testemunho do educador que ele ensinou e todos aprenderam aquilo que deveriam ter aprendido poderá ocorrer por qualquer símbolo, inclusive pelo registro numérico, desde que ele não estará representando a quantidade, mas sim a qualidade da aprendizagem dos estudantes.


OS ESTUDANTES JÁ NÃO ESTUDAM MAIS COMO ANTIGAMENTE. Estudam e estudarão, se efetivamente, nós educadores formos os “seus líderes” em sua aprendizagem. Se nossos olhos brilharem por aquilo que fazemos, os olhos de nossos estudantes brilharão por sua aprendizagem. Caso, nossos olhos não brilhem por aquilo que fazemos, como os olhos dos nossos estudantes brilharão por sua aprendizagem? Não. Não poderão ter olhos brilhantes por aquilo que seus líderes não o tem.


NO MEU TEMPO, QUE ERA DIFÍCIL, AGORA...  No passado, como no presente, nada terá a característica de “difícil”, do ponto de vista da aprendizagem, caso o ensino seja praticado com competência metodológica e qualidade positiva. Ou seja, o educador necessita assumir a atitude de que seu “estudante vai aprender aquilo que ensinar”, desde que, para isso, estará investindo o melhor de si, metodologicamente, confiante de que ele pode e deve aprender. E, caso anão tenha aprendido “ainda”, investirá de novo, e investirá de novo, e investirá de novo, até que o estudante aprenda.

Nossos estudantes são saudáveis e, por isso, para aprenderem, necessitam de efetivos cuidados por parte de nós educadores, tendo como pano de fundo: (01) a filosofia da educação (= todos aprenderão aquilo que for ensinado, segundo a idade e desenvolvimento do estudante), (02) o currículo (conteúdo a  ser ensinado), (03) ciências da educação, em especial a neurologia, que nos ensina que nosso sistema nervoso é plástico e que, através da ação de ensinar-aprender, de modo ativo, cria todos os circuitos possíveis de aprendizagens, que serão utilizados em desempenhos do presente e do futuro.


04. DO SENSO COMUM AO SENSO CRÍTICO


Agora, que vimos que os conceitos, circulantes em nosso meio pedagógico, com base no senso comum, estão dissonantes em relação ao conceito, epistemologicamente válido, sobre avaliação, podemos dar mais um passo nesse estudo.

Como vimos, nenhum desses conceitos emergentes do senso comum respondem às delimitações epistemológicas do que é o ato de avaliar. Eles tangenciam o que é o ato de avaliar e atuam por junção lógica, isto é, parecem tratar da avaliação, mas não tratam dela; tratam de conceitos e práticas parecidas, parciais e até mesmo de forma negativa.
Desse modo, se desejamos atuar com avaliação no campo da aprendizagem de nossos estudantes em nossas escolas, necessitaremos:


01.               ter claro que (a) o currículo nacional, (b) traduzido em plano pedagógico da escola, e, subsequentemente, (c) traduzido em plano de ensino para a sala de aula, é o parâmetro da qualidade tanto do ensino, como da aprendizagem dos estudantes, ou seja, ensina-se e aprende-se aquilo que está definido curricularmente;

02.               assumir que a prática do ensino é uma ação planejada e executada, com o máximo de competência e com o máximo de rigor metodológico, garantindo a aprendizagem satisfatória para todos os estudantes, não somente para um ou outro; para todos;


03.               compreender e praticar a avaliação da aprendizagem como um recurso subsidiário das decisões do educador em sua atuação a favor de um ensino competente e metodologicamente rigoroso, de tal forma de todos os estudantes cheguem à meta de aprender aquilo que é necessário que aprendam, de forma compatível com o currículo, sua idade e desenvolvimento;


04.               compreender que, para cumprir o definido no item anterior, a avaliação necessita ser praticada, com as configurações  do seu conceito epistemológico, ou seja, de que é um ato de investigar a qualidade da realidade, servindo-se de rigorosos métodos de coleta de dados sobre o desempenho dos estudantes. A qualificação da realidade do desempenho do estudante dá-se através da comparação entre a realidade descrita e seu padrão de qualidade, isto é, seu padrão de satisfatoriedade (= padrão do currículo estabelecido e assumido);


05.               compreender que a avaliação necessita ser praticada continuamente como um recurso de acompanhamento dos resultados da ação pedagógica do professor em sala de aula (= à medida que a ação pedagógica é continua, a avaliação, que a subsidia, também o é). Nesse contexto, a avaliação subsidia o educador a decidir se deve investir mais neste ou naquele conteúdo a ser aprendido, neste ou naquele estudante, ou em todos, de tal forma que todos aprendam o necessário.


Como consequência dessa forma de conduzir na prática pedagógica e do uso dos recursos da avaliação da aprendizagem, todos os estudantes terão aprendido o necessário, através de uma construção cotidiana, produzida pela interação entre educador e educandos.


Essa compreensão do ato de ensinar e de avaliar necessita ser administrada cotidianamente, todos os dias. Não se pode esperar um final de mês, de bimestre, de trimestre, de semestre ou de ano letivo, para intervir e corrigir desvios. Essa é uma conduta necessária em todos os dias, em todos os momentos da atividade pedagógica. Afinal, aprende-se pela atividade orientada.