domingo, 30 de novembro de 2014

80 - A questão da justificativa frente às dificuldades em obter sucesso na prática educativa escolar


Cipriano Luckesi


Ainda sobre proatividade na prática educativa escolar e na prática da avaliação como subsidiária do sucesso. Esse tema revela a todo gestor a necessidade de investir mais, e mais, se deseja sucesso em sua atividade.

Em várias oportunidades, estando partilhando conhecimentos sobre avaliação da aprendizagem, em conferências, seminários, simpósios, vem uma pergunta, enviada por um participante, mais ou menos assim: “Você aborda a avaliação como se ela se desse sem as interveniências das circunstâncias, tais como as condições sociais de onde vem e onde vive o educando, as condições de trabalho do educador, tais como número de estudantes por turma, carga horária, salario, entre outras”.

Escuto essa argumentação e me sinto solidário com quem a faz, desde que, de fato, temos condições adversas à execução de nossas atividades como docentes em nossas escolas, seja pelos determinantes psico-sociológicos de nossos educandos, seja pelos determinantes de nossas condições de trabalho.

Contudo, olhando pela perspectiva de que, como educadores em sala de aula, somos “gestores da sala de aula”, ou seja, somos profissionais que nos propomos a produzir resultados positivos com nossa ação --- afinal, “gestar resultados positivos” --- convido os presentes às palestras, conferências, simpósios a pensarem na necessidade de nos apegarmos à solução para os impasses com os quais nos confrontamos, ao invés de nos apegarmos às dificuldades que encontramos.

É certo e óbvio que temos múltiplos impasses que dificultam nossa ação de educadores nas instituições educativas, às quais estamos vinculados. Qual é o profissional que não se depara com impasses em sua ação?

Contudo, se nossa atenção permanecer prisioneira dos impasses, não haverá saída, à medida que, permanentemente, estaremos utilizando os impasses e dificuldades para justificar os insucessos de nossa ação.

Importa, pois, diante das dificuldades, reconhecer que elas existem e quais suas características e, então, colocar a atenção nas soluções. Reconhecer a existência de impasses é necessário e saudável; permanecer apegado a eles é desnecessário e doentio.

Olhar para as possibilidades de solução dos impasses parece-me ser o melhor caminho de escolhas em nossa vida, seja na vida profissional, seja na vida em geral. “Sentar-se e lamentar” não ajudará muita coisa na vida.

O que ajudará é a “proatividade”, isto é, entrar em contato com o problema, sem perder-se nele --- sem ser tomado por ele --- e, a seguir, encontrar a melhor solução possível. Poderá ocorrer que uma solução, que encontramos, não seja a mais pelna, mas será solução e, então, dela virão resultados positivos que nos estimularão a buscar mais, e mais, outras soluções.

O contrário disso, é o apego aos problemas. Então, eles parecem justificar nosso freio nos investimentos na busca de novas soluções. A frase mais comum é: “Como vou investir tanto, se as circunstâncias apresentam tantos impasses?”. Afirmação que parece justificar os baixos resultados de nossa ação.

Porém, é o contrário que contém a compreensão válida: “Problemas existem, quais as soluções?”

Para justificar nossas dificuldades em transitar do ato de examinar para o ato de avaliar nas escolas, encontraremos muitas justificativas, tais como: a estrutura do sistema escolar, turmas numerosas de estudantes, condições insatisfatórias de trabalho, condutas indisciplinadas dos estudantes, carência de envolvimento emocional dos estudantes nas atividades de estudo... Todavia, caso nos apeguemos a essa “floresta de justificativas”, não encontraremos uma “única árvore” que pode nos salvar do vendaval.

Estarmos atentos à solução nos colocará na direção justa do sucesso em nossas atividades.

Impasses? Sempre os teremos. Importa saber se nos dispomos a ultrapassá-los. Afinal nossa criatividade tem, que finalidade?

Tenho citado a experiência da cidade de Cocal dos Alves, no norte Estado do Piauí, como uma experiência bem sucedida de investir na solução e não os problemas.

Relembro-a aqui, convidando os leitores a entrar em contato com ela. Cocal dos Alves é uma cidade com aproximadamente cinco mil habitantes e com sucessos significativos e invejáveis nos resultados das atividades escolares.

Caso o leitor se sinta atraído pelo relato de uma experiência de olhar para a solução, ao invés de apegar-se ao problema como justificativa para os baixos resultados na própria ação, encontre, através de um buscador da internet, como o Google por exemplo, vários sites que oferecem informação sobre a experiência de Cocal dos Alves, com depoimentos de estudantes, de profissionais da educação, inclusive de Fernando Hadadd, quando Ministro da Educação.

Para tanto, basta colocar em um buscador da internet a expressão --- Educação em Cocal dos Alves --- e estará diante de múltiplos sites sobre o tema. O mesmo poderá ocorrer buscando --- YouTube + Educação em Cocal dos Alves.

Então, é só deliciar-se!

O que se vê nessas matérias jornalisticas é invejável, em termos de compreensão, cuidados e investimento. Tudo muito simples, mas dedicado e eficiente. Nada mais do que "ensinar bem para que os estudantes aprendam bem".

Os resultados estão expressos na alegria e dedicação dos estudantes, nos resultados em olimpíadas (já são muitas as medalhadas obtidas pelos estudantes), no acesso à universidade, assim como na vida pessoal de cada estudante, de suas famílias e da cidade.

Com desejo e dedicação, tudo é possível.





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terça-feira, 18 de novembro de 2014

79 – Avaliação da aprendizagem e atitude proativa IV – “papel da gestão escolar”


Cipriano Luckesi
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OBS - Os artigos 76; 77; 78 e 79 tem uma sequência de conteúdos sobre atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Ler na ordem crescente, de 76 para 79.
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Temos falado pouco no papel do gestor, como líder da equipe de uma escola, para que a instituição toda funcione com um único objetivo. Uma instituição deveria funcionar como uma orquestra, onde um líder dá suporte para que todos contribuam para a mesma finalidade, de modo harmônico. Ele está à frente. Sua conduta, se saudável, dará harmonia a todas as outras condutas. Haverá reverberação de sua conduta na conduta dos profissionais que lidera. É uma questão de ressonância.

Nós os pesquisadores da área da avaliação da aprendizagem, temos insistido em novas compreensões do ato e da prática de avaliar, contudo temos insistido pouco no papel do gestor de uma instituição escola como líder desse processo. A prática de avaliar a aprendizagem na escola, com certa adequação conceitual e metodológica, poderá e deverá ganhar um reforço essencial com o investimento da direção de uma escola nessa atividade.

O diretor ou a diretora de uma instituição escolar é o líder da instituição e, como tal, ele dará o tom nesse processo. Necessitará de ser proativo como seus professores deverão ser proativos nesse processo, se efetivamente, desejamos uma mudança nesse padrão de conduta.

Cada professor individual estará atuando sozinho em sua sala de aula, mas o diretor da instituição, se estiver atento, estará liderando todos os educadores da sua instituição para que estejam transitando do ato de examinar na escola (classificar) para o ato de avaliar (diagnosticar e, se necessário, reinvestir na busca de novos resultados). Ou seja, não será este ou aquele educador que estará atuando com avaliação, mas sim todos na sua instituição estarão atuando com avaliação.

Desse modo, a mudança para um novo modo de atuar será do conjunto de uma escola. Para tanto, o(a) diretor(a), como líder do grupo, será fundamental para esse processo de mudança e, pois, para a qualidade do atendimento aos educandos. Todos, sob a batuta do líder, estarão trabalhando para a efetiva aprendizagem de todos os educados dessa escola e não de uns poucos.

Existirão resistências de um ou outro educador em uma determinada escola? Com certeza, haverá, à medida que a proposição de qualquer mudança de conduta, já transformada em hábito cotidiano, fará emergir reações de defesa do modo corriqueiro e padronizado de atuar e, consequentemente, de recusa à uma nova possibilidade de agir.

O modo rotineiro de agir já se encontra incorporado no dia a dia; o novo modo de agir exige adaptações, tentativas. Psicologicamente, no geral, o ser humano funciona dessa forma. Aparentemente, o cotidiano está organizado e não há necessidade de mudanças. Todavia, para praticar avaliação, e não exames em nossas escolas, há a demanda de um investimento de todos os que atuam na instituição. Mas, para tanto, há necessidade de uma liderança que dê o tom à atividade e essa liderança pertence ao diretor e sua equipe.


Então, neste 4º post sobre “Avaliação da aprendizagem e atitude proativa”, vai um convite a todos os diretores de escola deste país para que, em suas instituições, criem condições e liderem uma conduta geral dos seus educadores para se servirem, em sala de aula, dos recursos da avaliação ao invés de estarem operando ainda com atos examinativos, classificatórios e excludentes, fator que tem gerado inúmeros dissabores na prática educativa, seja do ponto de vista individual, seja do ponto de vista coletivo.





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segunda-feira, 17 de novembro de 2014

78 – Avaliação da aprendizagem e atitude proativa III – “desempenho da turma de estudantes como desempenho do sistema de ensino”


Cipriano Luckesi

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OBS - Os artigos 76; 77; 78 e 79 tem uma sequência de conteúdos sobre atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Ler na ordem crescente, de 76 para 79.
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Este é o terceiro post da série sobre “atitude proativa do educador em torno da prática da avaliação da aprendizagem”.

Sinalizo, de início, que, para que a avaliação da aprendizagem seja efetiva, importa não só considerar o desempenho do estudante sob a ótica individual (se ele aprendeu ou não satisfatoriamente), mas também sob a ótica coletiva, do sistema de ensino.

Até os anos 1980, não só no Brasil, mas também em variadas partes do mundo, se considerava que o único responsável pelo fracasso escolar, acadêmico, era do estudante. A partir dessa década, expandiu-se a compreensão de que também o sistema fracassa, à medida que ele é o gestor do ensino e, por isso, está comprometido com essa tarefa. Afinal, ele é o responsável pela proposição e execução do ensino. Se o executor não cuida suficientemente bem da qualidade de sua ação, os resultados efetivamente não podem ser positivos.

Então, nesse contexto emergiram as avaliações denominadas de larga escala, cujo objetivo é detectar a satisfatoriedade ou insatisfatoriedade do sistema de ensino em cumprir o que promete, isto é, que ele ensina e que os estudantes aprendem.

Foi em função desse movimento que, no Brasil, a partir do final dos anos 1980 (com alguns ensaios anteriores, como o PARU – Programa de Avaliação da Reforma Universitária e o PAIUB – Programa de Avaliação Institucional da Universidade Brasileira), foi se estabelecendo um sistema nacional de avaliação de larga escala, onde o estudante individual oferece as informações (afinal, ele expressa, como aprendiz, a capacidade do sistema de ensinar) para que se possa aquilatar a qualidade do sistema de ensino em seu papel específico.

Como esse fato pode caracterizar e contribuir para a proatividade de um educador individual? Vejamos.

Vale a pena compreender que o sistema de ensino, em sua complexidade, se inicia nas decisões das políticas públicas do governo federal, com todo seu staff (Presidência, Ministérios, Congresso Nacional), prossegue nas decisões das políticas públicas dos governos estaduais, com seu respectivo staff, e prossegue ainda nas decisões das políticas públicas municipais, com seu staff, como também nas decisões das instituições escolares, com seu staff, e, finalmente na turma de estudante, da qual o educador individual é o líder. Então, o sistema de ensino, na direção hierárquica, de cima para baixo se encerra no professor em sala de aula e, de baixo para cima, se inicia na sua turma de estudantes.

N caso, avaliar o desempenho da turma de estudante é uma atividade que se encontra no primeiro degrau da avaliação de larga escala, ou seja, estar-se-á a perguntar se a atuação do educador como o primeiro profissional na escala hierárquica ascendente do sistema de ensino, e seu representante nesse nível, está sendo eficiente ou não. E, importa evidentemente, que ele seja eficiente. A única forma de saber se ele está sendo eficiente é investigar a qualidade de sua atuação através do desempenho dos estudantes com os quais ele trabalha. O desempenho da turma de estudante revela a qualidade do desempenho do educador em sala de aula.

Pode ser uma prática de avaliação bem simples, mas que indica a sua eficiência ou não, tal como uma escala de aproveitamento dos estudantes de uma determinada turma.

Vamos supor que temos uma turma de 45 estudantes e que os registros de aproveitamento sejam feitos por “notas escolares” (poderá ser feito por outros recursos de registros, como conceitos, letras ou adjetivos). A curva de aproveitamento mais simples possível é: “quantos estudantes obtiveram nota 10”, quantos obtiveram nota 9”, “quantos obtiveram nota 8” e assim por diante numa escala descendente até a nota zero.

Se nessa escala, 40 estudantes tiverem obtido notas entre 8 e 10, poder-se-á dizer que a maioria dos seus estudantes está aprendendo o suficiente, mas 5 deles estão necessitando de novas ajudas, tendo em vista chagarem ao desempenho necessário.

Agora, vamos supor o contrário, 5 estudantes dessa turma obtiveram resultados 8, 9 e 10; e 40 deles obtiveram resultados inferiores à nota 5. Nesse caso, o sistema de ensino estará se revelando ineficiente --- pois diz que ensina, mas somente 20% dos estudantes estão manifestando ter aprendido o necessário.

A proporção entre aqueles que aprenderam e os que não aprenderam o suficiente variará em cada turma, contudo será um termômetro para indicar se, esse nível do sistema de ensino está sendo eficiente ou não. E, no caso, o educador em sala de aula, como representante do sistema na sala de aula, está no centro de atenção. Ele está sendo eficiente ou não?

Se o resultado da avaliação, indicar que não está sendo eficiente, não necessita ser julgado e massacrado nem por si mesmo, nem pelos pares nem pela direção da escola. Haverá sim que investigar o que está ocorrendo para que essa turma de estudante não esteja aprendendo o que deveria aprender.

A razão pode estar na estrutura física ou administrativa da escola, pode estar no material didático utilizado, pode estar na metodologia utilizada pelo professor, pode estar no próprio modo de ser do professor ou em todas essas variáveis no seu conjunto.

São muitas as razões que podem estar como causa da insatisfatoriedade de desempenho de uma turma. A curva de aproveitamento, acima sugerida, indica, de modo inicial, se a turma está aprendendo o que deveria aprender, ou não; a seguir, importa aprofundar a investigação e descobrir onde está o impasse, que, por si, deve ser superado se se deseja eficiência no ensino. A exclusiva função da avaliação é ser parceira do gestor de qualquer atividade na busca da eficiência.

Só se poderá encontrar um caminho satisfatório para a eficiência do ensino numa turma de estudantes, dentro de uma escola, se se praticar uma avaliação do desempenho da turma. Mas, indo um pouco além: se se praticar a avaliação por turma “em todas as turmas” de uma determinada escola. Então, ter-se-á uma avaliação da escola inteira em sua eficiência, sob a liderança de um diretor de escola e seu staff. Não se pode esquecer que a eficiência de uma escola depende da capacidade do gestor de liderar essa instituição para a eficiência (abordaremos isso num próximo post).

A avaliação do desempenho da turma de estudantes, regida por cada professor, é mais um modo de ser proativo em avaliação da aprendizagem, o que implica em abandonar a compreensão de que o responsável pelo fracasso escolar é o estudante individual.

O objetivo será sempre, que “todos aprendam o necessário” e, para tanto, o sistema de ensino, cujo último elo descendente é o professor (depois dele, só existe o sistema aprendente, representado pelo estudante), necessita iniciar a se avaliar a partir desse ponto.

Em síntese, um educador proativo em avaliação da aprendizagem estará atento não só a um ou outro estudante de sua turma, tomado individualmente, mas a todos eles, pois que todos vieram à escola para aprender e, por isso, devem aprender.

Para tanto, o educador deverá lançar mão dos recursos próprios da avaliação da aprendizagem, como vem sendo trabalhado em sucessivos “posts” deste blog, como, por exemplo, no último (de número-guia 76 (04).

Sempre será absurdo afirmar que “um bom professor ou uma boa escola é aquele ou aquela que reprova bastante”. Como um profissional ou uma instituição pode ser aquilatado ou aquilatada de eficiente se não produz o resultado que promete produzir? Contudo, infelizmente, no senso comum social, por múltiplas vezes, é assim que se pensa. De fato, bom professor ou boa escola é aquele ou aquela onde os estudantes efetivamente aprendem o que necessitam de aprender.

A avaliação do desempenho de uma turma de estudante é um termômetro necessário para se iniciar a ter uma noção da eficiência do sistema de ensino.


Então, cuidar da avaliação da turma de estudante --- e usar os seus resultados para a melhoria do seu desempenho --- é uma forma essencial e necessária de uma postura proativa do educador que já conseguiu --- ou está conseguindo --- transitar da prática dos exames escolares para a avaliação.






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domingo, 16 de novembro de 2014

77 - Avaliação da aprendizagem e atitude proativa II --- “o que é ser proativo na prática avaliativa?”


Cipriano Luckesi

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OBS - Os artigos 76; 77; 78 e 79 tem uma sequência de conteúdos sobre atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Ler na ordem crescente, de 76 para 79.
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No post anterior --- de número-guia 76 (04) --- sinalizei a importância, nesse momento da prática educacional no país, da atitude proativa do educador em relação à necessária transição do ato de examinar para o ato de avaliar na escola, tendo em vista fazer desse recurso um parceiro do educador para o sucesso de sua atividade.

Agora, cabe a pergunta: Como agir, tendo em vista ser proativo na prática da avaliação da aprendizagem na escola? São vários os pontos que merecem ser sinalizados.

O primeiro deles tem a ver com a necessidade de efetivamente compreender que a atividade de avaliar está comprometida com o diagnóstico, diferente de estar comprometida com a classificação. A avaliação é um ato de investigar a qualidade da realidade, que, no caso aqui abordado, é a aprendizagem do educando.

A classificação --- sob a ótica de qualquer escala classificatória; notas, letras, adjetivos --- é uma escolha política, desde que o ato de avaliar, por si, tem a única função de revelar a qualidade da realidade.


Essa qualificação subsidia o gestor a tomar decisões de novas intervenções na busca de obter a melhor qualidade dos resultados que estão sendo desejados como finalidade de determinada ação. A classificação, por sua vez, encerra um processo desde, exatamente chegar a uma conclusão final. O diagnóstico é dinâmico, ele subsidia novas decisões; já a classificação é estática, devido encerrar um processo.

Então, o primeiro ponto a ser levado em consideração na configuração de uma atitude proativa no que se refere à avaliação da aprendizagem é compreender efetivamente esse ato com suas características epistemológicas, O mais comum, hoje, em nossas escolas, é utilizar o termo “avaliação”, contudo praticar “exames”, desde que, no dia a dia escolar, constantemente estamos praticando classificação dos nossos educandos, minimamente em “aprovado” ou “reprovado”.

Então, esse é um dos pontos de partida para uma atitude proativa no âmbito da avaliação da aprendizagem: modificar a compreensão.

Os gregos antigos denominavam essa transição de “metanóia”, isto é, “um conhecimento além do conhecimento atual”, uma conversão da consciência, necessária para orientar práticas novas.

O segundo ponto essencial para se assumir uma atitude proativa na prática da avaliação da aprendizagem em nossas escolas tem a ver com o uso de recursos metodológicos consistentes e adequados para essa prática. 

Nesse contexto, necessitamos partir do conceito de avaliação como “um ato de investigar a qualidade da realidade”, o que implica que, de imediato, ela se expressa como “um ato de investigar”, isto é, uma prática de “revelar” a realidade, que, aqui no caso, é revelar a sua qualidade. 

Para tanto, necessita ter uma base na realidade do objeto da avaliação, o que implica na sua descritiva, que, por sua vez, tem sua base em dados da realidade. O ato de avaliar baliza-se na descritiva da realidade; distinguindo-se completamente da opinião (que, usualmente, é emocional, subjetiva, intempestiva).

Esse fato leva o educador proativo, no que se refere à avaliação da aprendizagem, a cuidar dos dados que são a base do seu juízo de qualidade sobre o desempenho do educando. Para a coleta dos dados sobre o desempenho do educando, o educador no papel de avaliador, necessita de selecionar e elaborar instrumentos de coleta de dados, que apresentem rigor metodológico, a fim de que os dados obtidos não nos enganem.

Minimamente, esses instrumentos necessitarão ser elaborados com quatro características básicas: 01. serem sistemáticos, isto é, cobrir sistematicamente todos os conteúdos essenciais ensinados; nem mais nem menos que isso; 02. serem compreensíveis para o educando, ou seja, importa que o estudante compreenda o que se lhe pergunta; 03. serem compatíveis com o ensinado, ou seja, só se pode solicitar ao educando desempenho satisfatório naquilo que efetivamente ele foi ensinado, em termos de conteúdos, linguagens utilizadas, metodologia de abordagem dos conteúdos ensinados, níveis de dificuldade e de complexidade dos conteúdos; nada fora disso; 04. serem precisos no que solicitam, isto é, educador e educando compreendem com o mesmo significado o que se solicita; o significado do que se solicita não pode ter equívocos; não se pode introduzir “armadilhas”, “pegadinhas”, para ver se os estudantes os resolvem.

Sobre coleta de dados para a avaliação, ver meu livro Avaliação da aprendizagem componente do ato pedagógico, Cortez Editora, São Paulo, 2012, especialmente nas páginas 295 a 378.

Não se pode descuidar dessas qualidades necessárias de um instrumento de coleta de dados sobre o desempenho do educando, sob a pena de nos enganarmos, assim como enganar estudantes, educadores, pais, autoridade... Ou seja, necessita ser rigorosamente elaborado e utilizado, evitando descritivas inadequadas da realidade.

Para completar a compreensão do ato de avaliar como “ato de investigar a realidade”, importa assumir que a qualidade é atribuída à realidade pelo avaliador tendo por base um critério de qualificação, um parâmetro. Esse critério é configurado, no caso do ensino escolar, no momento em que estabelecemos o currículo, como, de modo mais preciso, no momento que planejamos o ensino.

Quem planeja a realização de uma atividade deve ter claro para si o resultado que pretende obter com essa ação, assim como a qualidade que deverá apresentar os resultados dessa ação. A atribuição de qualidade ao desempenho do estudante, descrito através dos instrumentos de coleta de dados, emergirá da comparação da realidade descrita com esse critério de qualidade. Caso os resultados obtidos preencham o critério de qualidade desejada, afirmamos que a realidade é satisfatória; caso ocorra o contrário, ou seja, quando os dados da realidade não preencham o critério, a qualidade do resultado será considerada insatisfatória.

Por último, para assumirmos uma atitude proativa em avaliação da aprendizagem, necessitamos exercitar o compromisso diuturno de que, quando o resultado planejado e desejado não foi atingido, vamos investir mais, e mais, na busca desse resultado. Um gestor não desiste de obter os resultados desejados para sua ação, a não ser sob determinações plenamente razoáveis.

E, esse resultado positivo da ação só será assumido como satisfatório quando for universal, isto é, que no caso todos os educandos, com os quais trabalhamos, aprenderam o que deveriam ter aprendido. Esse é o compromisso com a efetividade de nossa ação, mas sobretudo com a democratização da sociedade, ou seja, todos aprendem o que necessitam de aprender.

O compromisso e a prática diuturna dos pontos acima sinalizados comporão nossa atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Com isso, estaremos transitando do ato de examinar para o ato de avaliar em nossas escolas e, para daqui a mais alguns anos, em decorrência desse nosso investimento, não teremos mais em nossas escolas retenções ou reprovações de educandos, mas sim aprendizagem com a qualidade positiva necessária.

Então, teremos deixado para trás definitivamente os traços de uma prática educativa excludente, ao menos no seio da escola, ambiente onde atuamos e onde nos realizamos como profissionais. Atuar de tal forma que os resultados de nossa ação sejam positivos trará a todos nós bem-estar e sensação de realização, capacidade de agir e produzir os resultados que necessitam ser produzidos.

Transitar do ato de examinar para o ato de avaliar na escola significa a atitude proativa de fazer da avaliação nossa parceira na busca do sucesso.






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sexta-feira, 14 de novembro de 2014

76 - Avaliação da aprendizagem e atitude proativa I --- da necessidade de uma atitude proativa em avaliação da aprendizagem


Cipriano Luckesi

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OBS - Os artigos  76; 77; 78 e 79 tem uma sequência de conteúdos sobre atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Ler na ordem crescente, de 76 para 79.
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Atuo no âmbito da avaliação da aprendizagem há muitos anos, como também na área da educação em geral. Tem me chamado a atenção o tempo que demoramos para atingirmos um novo padrão de conduta nessa área.

Iniciei a estudar essa área de conhecimentos e de prática pedagógica, quando era estudante universitário, no final dos anos 1960. De lá para cá, passaram-se um pouco mais de quarenta anos. Mudamos bastante a compreensão sobre essa prática na educação escolar, mas mudamos pouco na prática do cotidiano em nossas escolas. Seminários, simpósios, congressos, revistas, livros, tem trazido a todos nós possibilidades de compreender avaliação da aprendizagem de uma forma adequada. A esperança era de que, em compreendendo, passássemos à ação.

Temos compreendido essa fenomenologia de um modo melhor e mais adequado do que no passado. Todavia, a prática ainda permanece prisioneira daquilo que vem se denominando de educação tradicional, que contém hábitos e distorções históricas que se acumularam nos últimos quinhentos anos de educação escolar, mais por determinações do senso comum do que por concepções pedagógicas consistentemente configuradas.

Por “senso comum” compreendo os hábitos nascidos de uma prática repetida, quase que ao infinito, por gerações, sem que se desenvolvesse um senso crítico sobre esse fenômeno que denominamos de avaliação da aprendizagem escolar.

Na Ratio Studiorum, documento que contém as normas e as compreensões sobre educação no seio da Companhia dos Padres Jesuítas, publicado em 1599, consta que os exames escolares deveriam ocorrer ao final do ano letivo, tendo em vista promover, ou não, os estudantes para a classe subsequente.

Durante o ano escolar, o professor deveria acompanhar os estudantes e fazer anotações em sua Pauta (hoje, seria denominada Caderneta do Professor) sobre cada estudante. Para a promoção de uma classe para a outra, a Banca Examinadora deveria levar em conta tanto os resultados dos exames escolares como as anotações contidas na Pauta do Professor. Os exames escolares, escritos e orais, eram da responsabilidade de uma Banca Examinadora, constituída pelo administrador acadêmico da escola [= Prefeito de Estudos] e mais dois outros professores, de outras escolas; já a Pauta do Professor era de responsabilidade do professor que acompanhava a turma de estudantes durante o ano letivo.

Com os passar dos anos, os exames escolares invadiram o espaço do “acompanhamento” dos estudantes, permanecendo os sucessivos exames e praticamente nenhum acompanhamento. Nos anos 1950 e 1960, no Brasil, usualmente, os estudantes eram submetidos às provas mensais e mais as provas semestrais (meio do ano letivo) e mais as provas finais (final do ano letivo). Hoje, os exames em nossas escolas, usualmente, são bimestrais. Afinal, os exames sucessivos substituíram o acompanhamento e, nós, pelo senso comum pedagógico, nem nos perguntamos sobre o significado dessa prática. Um senso comum pragmático tomou conta de nossas práticas. Gerações passadas “fizeram assim, também nós fazemos” ou “o que aconteceu comigo deve acontecer com os meus estudantes”,...
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Fico a pensar que, hoje, estamos devendo à educação escolar e aos estudantes em nossas escolas uma mudança de rumos. Uma conduta proativa visando integrar o que pode ter de significativo nos exames escolares, mas especialmente ultrapassando-os, deixando-os no passado no que se refere à prática escolar. Os exames escolares podem e devem continuar a ser utilizados nos concursos públicos. Estes são seletivos e, por isso, devem desaparecer da sala de aula, que, por si, deve ser inclusiva. Os estudantes, que se encontram numa sala de aula, vieram para aprender e não para conquistar uma vaga. A vaga, eles já a têm; só importa aprender.

Não basta uma compreensão nova sobre avaliação da aprendizagem, importa uma ação nova. E esta, no caso que vimos abordando neste blog, será o ato de transitar do ato de examinar para o ato de avaliar a aprendizagem em nossas escolas.

A avaliação será, então, nossa parceira na busca do sucesso de todos os nossos educandos em suas aprendizagens. O ato de avaliar não aprova nem reprova, avalia, ou seja, investiga a qualidade da aprendizagem dos educandos, tendo em vista, se necessário, proceder novas intervenções, tendo em vista a obtenção dos resultados desejados, isto é, resultados satisfatórios.

No cotidiano de nossas vidas, em nossas ações diárias, nós nos servimos permanentemente da avaliação para atingirmos os objetivos que traçamos. Só na prática educativa escolar não utilizamos a avaliação como recurso de sucesso. Está na hora de sermos proativos e darmos uma chance às novas compreensões que temos estabelecidos sobre avaliação da aprendizagem na escola.

Importa passarmos da teoria à prática. Então, amanhã, em nossas atividades escolares, vamos investir --- entre outras condutas novas de que o ensino está necessitando --- na avaliação da aprendizagem.

Sobre os conceitos e recursos metodológicos para praticar a avaliação da aprendizagem, o leitor poderá contar com todos os textos desse blog, assim como com meus livros, publicados pela Cortez Editora, São Paulo: Avaliação da aprendizagem escolar: estudos e proposições (22a edição, 2012); Avaliação da aprendizagem: componente do ato pedagógico (2011); Sobre notas escolares: distúrbios e possibilidades (2014). E, ainda pode contar com o site  --- http://www.luckesi.com.br






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75 - Registro do desempenho do estudante e avaliação



Cipriano Luckesi



Ainda que já tenha escrito sobre o tema das notas e registros da qualidade do desempenho dos estudantes, de vez em quando, recebo uma pergunta com esse mesmo viés de abordagem. Então, mais uma vez cuido desse tema.

Para iniciar, importa dizer que não há diferença entre os registros dos resultados escolares por nota (registro numérico) ou por conceitos (registro por letras ou qualidades), ou ainda por um relatório descritivo das condutas dos estudantes. Será sempre registro, somente isso.

Esse fato justifica a prática comum entre os educadores de traduzir (intermediar) um modelo de registro por outro; fenômeno conhecido de todos. As perguntas no cotidiano escolar são aproximadamente assim: “S” vale quanto? “M” vale quanto? “I” vale quanto? “Esse seu relatório descritivo da aprendizagem do estudante vale que nota?”. E, desse modo, em diante...

A avaliação não tem a ver com a “forma de registro de resultados”, mas sim com o “acompanhamento da qualidade dos resultados obtidos na prática de ensinar e aprender” E, se necessário, oferecer base para uma intervenção na perspectiva de melhorar a qualidade do desempenho, que, por acaso, ainda não fora atingira.

Então, a questão não está no registro por números, letras ou qualidades, mas sim no investimento do educador na efetiva aprendizagem do educando.

O registro do desempenho do educando é uma forma do educador testemunhar que ele acompanhou esse estudante no decorrer de um determinado período e ele aprendeu o que deveria ter aprendido. Ao professor interessa ensinar para que o estudante aprenda. O registro faz parte da memória institucional e social; memória necessária, mas somente memória. O registro da qualidade do desempenho do estudante, por si, é um registro; não representa o ato de avaliar.

Numa escola, o estafe escolar (diretor, coordenador, supervisor) deveriam liderar os educadores em sala de aula para que eles efetivamente produzam os resultados que devem produzir, isto é, ensinem bem para que os educandos aprendam bem. Isso implica que efetivamente os educadores saibam mediar o ensino para que os educandos aprendam, o que, por sua vez, implica em competência didática, ao lado, sobretudo, do investimento pleno na atividade que desenvolvem.


O registro conterá uma memória dos resultados dessa ação. Então, nesse contexto, vale a pena lembrar que a escola promete que ensina e que, por isso, os estudantes aprendem. Esse é seu metier. Os resultados do desempenho dos estudantes revelam a qualidade da escola. Se os estudantes aprendem o que deveriam aprender, o registro do seu desempenho tem a única função de manter oficialmente a memória de que esse estudante foi acompanhado e aprendeu o que deveria ter aprendido. Nota, conceito, relatório são modos de registrar a memória da passagem do estudante pela escola e não a avaliação, propriamente dita.






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