domingo, 16 de novembro de 2014

77 - Avaliação da aprendizagem e atitude proativa II --- “o que é ser proativo na prática avaliativa?”


Cipriano Luckesi

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OBS - Os artigos 76; 77; 78 e 79 tem uma sequência de conteúdos sobre atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Ler na ordem crescente, de 76 para 79.
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No post anterior --- de número-guia 76 (04) --- sinalizei a importância, nesse momento da prática educacional no país, da atitude proativa do educador em relação à necessária transição do ato de examinar para o ato de avaliar na escola, tendo em vista fazer desse recurso um parceiro do educador para o sucesso de sua atividade.

Agora, cabe a pergunta: Como agir, tendo em vista ser proativo na prática da avaliação da aprendizagem na escola? São vários os pontos que merecem ser sinalizados.

O primeiro deles tem a ver com a necessidade de efetivamente compreender que a atividade de avaliar está comprometida com o diagnóstico, diferente de estar comprometida com a classificação. A avaliação é um ato de investigar a qualidade da realidade, que, no caso aqui abordado, é a aprendizagem do educando.

A classificação --- sob a ótica de qualquer escala classificatória; notas, letras, adjetivos --- é uma escolha política, desde que o ato de avaliar, por si, tem a única função de revelar a qualidade da realidade.


Essa qualificação subsidia o gestor a tomar decisões de novas intervenções na busca de obter a melhor qualidade dos resultados que estão sendo desejados como finalidade de determinada ação. A classificação, por sua vez, encerra um processo desde, exatamente chegar a uma conclusão final. O diagnóstico é dinâmico, ele subsidia novas decisões; já a classificação é estática, devido encerrar um processo.

Então, o primeiro ponto a ser levado em consideração na configuração de uma atitude proativa no que se refere à avaliação da aprendizagem é compreender efetivamente esse ato com suas características epistemológicas, O mais comum, hoje, em nossas escolas, é utilizar o termo “avaliação”, contudo praticar “exames”, desde que, no dia a dia escolar, constantemente estamos praticando classificação dos nossos educandos, minimamente em “aprovado” ou “reprovado”.

Então, esse é um dos pontos de partida para uma atitude proativa no âmbito da avaliação da aprendizagem: modificar a compreensão.

Os gregos antigos denominavam essa transição de “metanóia”, isto é, “um conhecimento além do conhecimento atual”, uma conversão da consciência, necessária para orientar práticas novas.

O segundo ponto essencial para se assumir uma atitude proativa na prática da avaliação da aprendizagem em nossas escolas tem a ver com o uso de recursos metodológicos consistentes e adequados para essa prática. 

Nesse contexto, necessitamos partir do conceito de avaliação como “um ato de investigar a qualidade da realidade”, o que implica que, de imediato, ela se expressa como “um ato de investigar”, isto é, uma prática de “revelar” a realidade, que, aqui no caso, é revelar a sua qualidade. 

Para tanto, necessita ter uma base na realidade do objeto da avaliação, o que implica na sua descritiva, que, por sua vez, tem sua base em dados da realidade. O ato de avaliar baliza-se na descritiva da realidade; distinguindo-se completamente da opinião (que, usualmente, é emocional, subjetiva, intempestiva).

Esse fato leva o educador proativo, no que se refere à avaliação da aprendizagem, a cuidar dos dados que são a base do seu juízo de qualidade sobre o desempenho do educando. Para a coleta dos dados sobre o desempenho do educando, o educador no papel de avaliador, necessita de selecionar e elaborar instrumentos de coleta de dados, que apresentem rigor metodológico, a fim de que os dados obtidos não nos enganem.

Minimamente, esses instrumentos necessitarão ser elaborados com quatro características básicas: 01. serem sistemáticos, isto é, cobrir sistematicamente todos os conteúdos essenciais ensinados; nem mais nem menos que isso; 02. serem compreensíveis para o educando, ou seja, importa que o estudante compreenda o que se lhe pergunta; 03. serem compatíveis com o ensinado, ou seja, só se pode solicitar ao educando desempenho satisfatório naquilo que efetivamente ele foi ensinado, em termos de conteúdos, linguagens utilizadas, metodologia de abordagem dos conteúdos ensinados, níveis de dificuldade e de complexidade dos conteúdos; nada fora disso; 04. serem precisos no que solicitam, isto é, educador e educando compreendem com o mesmo significado o que se solicita; o significado do que se solicita não pode ter equívocos; não se pode introduzir “armadilhas”, “pegadinhas”, para ver se os estudantes os resolvem.

Sobre coleta de dados para a avaliação, ver meu livro Avaliação da aprendizagem componente do ato pedagógico, Cortez Editora, São Paulo, 2012, especialmente nas páginas 295 a 378.

Não se pode descuidar dessas qualidades necessárias de um instrumento de coleta de dados sobre o desempenho do educando, sob a pena de nos enganarmos, assim como enganar estudantes, educadores, pais, autoridade... Ou seja, necessita ser rigorosamente elaborado e utilizado, evitando descritivas inadequadas da realidade.

Para completar a compreensão do ato de avaliar como “ato de investigar a realidade”, importa assumir que a qualidade é atribuída à realidade pelo avaliador tendo por base um critério de qualificação, um parâmetro. Esse critério é configurado, no caso do ensino escolar, no momento em que estabelecemos o currículo, como, de modo mais preciso, no momento que planejamos o ensino.

Quem planeja a realização de uma atividade deve ter claro para si o resultado que pretende obter com essa ação, assim como a qualidade que deverá apresentar os resultados dessa ação. A atribuição de qualidade ao desempenho do estudante, descrito através dos instrumentos de coleta de dados, emergirá da comparação da realidade descrita com esse critério de qualidade. Caso os resultados obtidos preencham o critério de qualidade desejada, afirmamos que a realidade é satisfatória; caso ocorra o contrário, ou seja, quando os dados da realidade não preencham o critério, a qualidade do resultado será considerada insatisfatória.

Por último, para assumirmos uma atitude proativa em avaliação da aprendizagem, necessitamos exercitar o compromisso diuturno de que, quando o resultado planejado e desejado não foi atingido, vamos investir mais, e mais, na busca desse resultado. Um gestor não desiste de obter os resultados desejados para sua ação, a não ser sob determinações plenamente razoáveis.

E, esse resultado positivo da ação só será assumido como satisfatório quando for universal, isto é, que no caso todos os educandos, com os quais trabalhamos, aprenderam o que deveriam ter aprendido. Esse é o compromisso com a efetividade de nossa ação, mas sobretudo com a democratização da sociedade, ou seja, todos aprendem o que necessitam de aprender.

O compromisso e a prática diuturna dos pontos acima sinalizados comporão nossa atitude proativa em avaliação da aprendizagem. Com isso, estaremos transitando do ato de examinar para o ato de avaliar em nossas escolas e, para daqui a mais alguns anos, em decorrência desse nosso investimento, não teremos mais em nossas escolas retenções ou reprovações de educandos, mas sim aprendizagem com a qualidade positiva necessária.

Então, teremos deixado para trás definitivamente os traços de uma prática educativa excludente, ao menos no seio da escola, ambiente onde atuamos e onde nos realizamos como profissionais. Atuar de tal forma que os resultados de nossa ação sejam positivos trará a todos nós bem-estar e sensação de realização, capacidade de agir e produzir os resultados que necessitam ser produzidos.

Transitar do ato de examinar para o ato de avaliar na escola significa a atitude proativa de fazer da avaliação nossa parceira na busca do sucesso.






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