Texto publicado anteriormente no Blog Terra na data 14 de novembro de 2012.
Cipriano Luckesi
O ENEM (Exame Nacional de Ensino Médio) nasceu no movimento de avaliação
institucional e de larga escala, implantado no Brasil, assim como em outros
países, desde os finais dos anos 1980 e inícios dos anos 1990. Com essa postura
se reconheceu que o fracasso ou sucesso na educação não é só responsabilidade
do educando, como sempre se compreendeu desde o século XVI até nossos dias. Com
isso, se assumiu que também o sistema de ensino fracassa, caso ele não tome em
consideração as variáveis que garantem a qualidade do investimento, seja ele
financeiro, de espaço físico e de pessoal.
A primeira versão do Enem é de 1998. No ano de 2009, o Ministério da
Educação decidiu incorporar ao Enem, além de um recurso de avaliação, um
recurso de seleção para o Ensino Superior, dando a ele uma qualidade e um
status, já existente em outros países, como o “Exame de Maturidade”, praticado
na Europa no final do Ensino Médio e que possibilita o acesso ao Ensino
Superior; o mesmo ocorrendo com o SAT (Scholastic Assessment
Test), nos Estados Unidos.
Pareceria que o Mec só estaria assumindo uma prática, que, de alguma
forma, já vinha sendo utilizada por algumas instituições de ensino superior no
Brasil, que vinham utilizando os resultados do Enem como recurso de seleção.
Porém, a meu ver, é muito mais que isso.
O Enem tem matrizes (estrutura curricular por áreas de conhecimentos,
acompanhada do mapa das habilidades e competências, que servem de base para
construir os instrumentos de coleta de dados sobre o desempenho dos educandos)
um tanto diferente das matrizes, hoje, utilizadas em nossas escolas de Ensino
Médio.
De fato, entendo que o novo Enem terá um papel que vai, e irá, muito
além da avaliação do ensino médio e da seleção para o ensino superior. É um
modo de subsidiar um novo rumo para o Ensino Médio no país.
Isso fica claro se se compreender o que vem ocorrendo da forma como se
segue.
Nos últimos cinquenta anos da educação nacional, o vestibular deu a
forma ao Ensino Médio (currículo e práticas docentes, voltados para o
vestibular) que temos hoje. O novo Enem, a partir de 2009, à medida que, além
de ser recurso de avaliação do sistema nacional de ensino, também seleciona
para o ensino superior, deverá, a curto e médio prazos, exigir das escolas e
dos educadores adaptações às novas exigências para a seleção do ensino
superior, o que implicará num novo modelo de ensino médio, que ainda, de alguma
forma, estará “preparando para o ensino superior”. Ficando ciente de que as
matrizes do Enem, como base das práticas seletivas para o ensino superior, “obrigariam”
novas orientações para o Ensino Médio, o que será bastante saudável. Nossos
educandos, matriculados no terceiro ano do Ensino Médio, passam ao menos esse
ano letivo bastante estressados com o vestibular e pouco atentos à sua formação
como seres humanos e cidadãos.
Sustentando a prática do novo Enem, por um médio tempo, como o fez o
vestibular anteriormente, determinará também o Ensino Médio, a partir do fato
de que escolas e professores se adaptarão às novas regras seletivas, o que
implicará que passarão a utilizar as matrizes do Enem em seu modo de ser e agir
na prática educativa. Ou seja, escolas e professores estarão se adaptando às
novas regras de seleção para o ensino superior, o que implicará num ar novo
para o Ensino Médio no país; certamente muito menos formalista e mais vital que
o modelo atual.
Desse modo, a meu ver, o novo Enem deve ser sustentado seja como recurso
de avaliação do Ensino Médio no país (política e administrativamente,
necessitamos de uma avaliação do sistema de ensino), seja como recurso de
seleção (um modo único de selecionar para o ensino superior em todo o país, o
que também obrigará que as escolas dos diversos rincões desta nossa terra
investir qualidade do ensino, orientadas pelos novos currículos = matrizes
do Enem). Essa dinâmica, com certeza, trará significativos desdobramentos
pedagógicos para o Ensino Médio.
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