sexta-feira, 26 de setembro de 2014

22 - Investigação em geral e avaliação como ato de investigar

Este texto fora publicado anteriormente no Terra Blog em 03 de julho de 2009
OBS - para sua republicação neste blog, sofreu pequenos ajustes.


Recebi a seguinte pergunta:

“A questão crucial em nossos estudos é: qual a diferença entre estudos de investigação e de avaliação?”.


Respondi como se segue:

Não tenho uma bibliografia para indicar a você que aborde a distinção entre a pesquisa em geral e a avaliação como um ato de investigar a qualidade do resultado de uma ação humana ou de um ambiente, ou seja, a distinção entre pesquisar na ciência e investigar na avaliação.

Posso fazer-lhe alguma indicação de minha compreensão, mesmo porque tenho feito essa colocação em meus escritos e em minhas falas. E tenho trabalhado sobre isso.

Tenho defendido a compreensão de que o ato de avaliar é um ato de investigar. Então, o que difere a avaliação em relação à investigação em geral é o objeto da investigação da avaliação, que difere dos objetos de investigação em outras áreas do conhecimento.

No geral, a pesquisa trabalha com os fenômenos caracterizados como físicos, químicos, sociais, psicológicos, astronômicos, etc. Já a avaliação é uma investigação que se caracteriza por trabalhar com a qualidade do fenômeno que estuda, ou seja, ela investiga o seu objeto sob a ótica de sua qualidade, enquanto a pesquisa em geral estuda o fenômeno pela sua constituição (causalidade unidirecional ou sistêmica — múltiplas determinações —, a depender o enfoque do pesquisador) e pelo seu modo de operar. Propriamente, a investigação científica busca compreender e revelar “como a realidade funciona” e a investigação avaliativa busca compreender e revelar “a qualidade da realidade”.

Na prática avaliativa, também poderemos operar com o olhar unidirecional ou sistêmico (a depender dos fundamentos epistemológicos com os quais trabalhamos), mas tendo sempre como foco de investigação a qualidade que emerge das características da realidade e não, em primeiro lugar, sua constituição e operação.

Com isso, estou lembrando que, para investigar --- seja na ciência ou na avaliação ---, necessitamos, sim, de coletar dados da realidade, que sustentem uma descritiva do fenômeno que estamos estudando, que subsidiem nossas “leituras” dessa realidade.

A “leitura da realidade” na avaliação exige uma atribuição de qualidade à realidade, o que implica na comparação do fenômeno descrito com um padrão ou critério de qualidade, tendo em vista dar suporte ao juízo qualitativo, próprio da avaliação.

A pesquisa científica, por seu turno, trabalha com a constituição e a operação da realidade. Então, enquanto a pesquisa em geral revela como a realidade funciona, a avaliação, tendo por base uma descritiva da realidade, revela a sua qualidade.

Não podemos nos esquecer que, para revelar a qualidade da realidade, a avaliação atribui uma qualidade à realidade, tendo por base sua descritiva, isto é, a avaliação se assenta sobre a “materialidade” da realidade. “materialidade” não necessariamente que dizer “materialidade física”; aqui, no caso, ela está comprometida com os dados que configuram a realidade, seja ela material ou não.

 Nesse contexto, a avaliação está comprometida epistemologicamente com os juízos de qualidade, diferentes dos juízos de realidade. Isso nos remete ao campo da filosofia que estuda “juízos de valor” e “juízos de realidade”, que, em última instância, vai esbarrar na configuração ontológica do que é o ser e do que é o valor (= qualidade)

A avaliação trabalha com os juízos de valor (qualidade = adjetivo), diferente das ciências em geral que trabalham com o juízo de realidade (substantivo = o que é). Frente à compreensão epistemológica de que os juízos de valor (ou qualidade) necessitam de estar, obrigatoriamente, calçados numa descrição da realidade, como assinalei acima, faz com que a avaliação não seja assumida como expressão de puros estados emocionais do avaliador. Caso não haja uma satisfatória descritiva da realidade, cairemos sim no subjetivismo, o que pode significar uma prática inadequada do ato de avaliar, e não uma característica própria da avaliação.

Deste modo, a avaliação é uma investigação, sim; porém com um objeto próprio, que é a qualidade dos fenômenos com os quais ela atua.

Importa ainda uma observação. A avaliação atua em duas direções possíveis. De um lado, ela é formativa (processual, contínua…), ou seja, subsidia um processo de ação, enquanto esse processo está se realizando e, pois, produzindo resultados intermediários (em construção); e, de outro, ela pode se apresentar como uma avaliação certificativa, que tem por intenção atestar (testemunhar) a qualidade de alguma coisa na sua completude.

A exemplo, posso lembrar o padrão ISO, que é uma certificação internacional de empresas e instituições. Para estabelecer essa certificação, dá-se um consistente processo investigativo, que permite atribuir a uma empresa ou instituição a qualidade ISO… “x”, ou seja, afirma-se que essa instituição apresenta uma qualidade tal e, por isso, lhe é oferecido um certificado socialmente reconhecido, que testemunha a sua qualidade.

No que se refere à uma instituição, a avaliação formativa tem a ver com a investigação permanente dos resultados decorrentes de sua atuação diária (processo). Já a avaliação certificativa é a investigação que atesta que essa instituição apresenta uma qualidade X em seus produtos, atendimentos, cuidados…. (resultado pleno). O mesmo pode ocorrer com qualquer outro fenômeno que seja investigado em sua qualidade — um grupo social, uma comunidade, um espaço físico, a aprendizagem de um estudante, a atuação de uma escola como organização…

Com essa exposição, espero e desejo ter podido auxiliar na compreensão da semelhança e da diferença entre investigar em geral (ciência) e avaliar como um ato de investigar.






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