Texto publicado anteriormente no Terra Blog, em 14/4/2008
Cipriano Luckesi
O ato de avaliar incide sobre a
aprendizagem e o de selecionar sobre o aprendido. A diferença parece ser
pequena, contudo fundamental. Enquanto a aprendizagem se realiza como processo
de aprender, o aprendido é resultado desse processo. Por isso, se diz que a
aprendizagem é processo e o aprendido é produto.
O processo avaliativo da aprendizagem
tem por função investigar a qualidade do que foi aprendido, diante de um
determinado critério, revelando tanto o que foi aprendido como aquilo que ainda
falta aprender e que, por isso, é necessário que seja reensinado, o que, por
si, conduz às atividades de intervenção caso se deseje obter o melhor resultado
possível. Assim, a avaliação da aprendizagem está comprometida com a construção
da própria aprendizagem. Ela incide sobre o que está acontecendo com o
aprendiz.
A seleção, com base nas competências de
um determinado sujeito numa determinada área de conhecimentos, reveladas
através de procedimentos de coleta de dados sobre seu desempenho (testes,
provas…), tem a função de distinguir e separar os admitidos dos não admitidos.
A seleção está comprometida com o aprendido, com aquilo que já aconteceu, e
incide, portanto, sobre o passado (= aquilo que já foi aprendido). Ninguém é
selecionado para um emprego, por exemplo, exatamente porque ele não detém os
conhecimentos procedimentos dessa atividade; ao contrário, é o aprendizado já
realizado que o faz competente o suficiente para ser selecionado.
Os instrumentos para a coleta de dados
para a avaliação, como para a seleção, podem ser os mesmos, a diferença entre
os dois procedimentos, no entanto, está na finalidade de cada um deles, mais
precisamente, na leitura que se fará desses dados: a avaliação coleta dados
para proceder a um diagnóstico da situação presente do aprendiz, tendo em vista
sua reorientação, se necessária; a seleção coleta dados sobre o aprendido pelo
candidato (suas habilidades, competências, atitudes), tendo em vista
classificá-lo em aceito ou não-aceito, polaridade esta que equivale a outras,
tais como em aprovado/reprovado, admitido/não-admitido.
Essas distinções nos permitem perceber
que, quando um estudante vem para a escola (para a sala de aulas), ele não vem
como candidato a uma vaga (no serviço público, numa empresa, ou como candidato
a uma bolsa de estudos…) ou a um lugar num concurso qualquer (miss, mister,
cantor…). De fato, ele já tem uma vaga, já tem o seu lugar. Na escola, ele tem
o lugar de aprendiz. Nessa condição, o que ele demanda é ser ensinado para que
aprenda, diferentemente de ser selecionado.
Retomando os conceitos: avaliar a
aprendizagem é diagnosticar o desempenho do educando para construir o melhor
resultado, tendo por base o presente e o futuro; selecionar é classificar o
candidato dentro de uma escala de valores, que tem um grau, a partir do qual se
aprova e admite e, aquém do qual, se reprova e se exclui.
Nesse contexto, na escola, espaço de
ensino e aprendizagem, a seletividade não faz sentido; também, num concurso,
espaço de seletividade, a avaliação não faz sentido. O estudante vem à escola
para aprender e não para ser selecionado; num concurso, um candidato se submete
a ele para ser selecionado e não para aprender.
Assim sendo quando alguém diz “naquele
concurso não houve nada de avaliação”, de fato, num concurso, não tem mesmo que
haver nada de avaliação, no sentido de diagnóstico e intervenção para a
melhoria da aprendizagem, pois que quem se submete a um concurso está dizendo:
“Eu possuo conhecimentos e habilidades suficientes e satisfatórios nessa área
para a qual concorro a uma vaga”. Fato este que nos permite compreender que,
usando os conceitos, que vimos utilizando, de exames escolares e de avaliação
escolar, podemos dizer que num concurso seus administradores devem se servir
dos exames (que são classificatórios e seletivos) e não da avaliação (que é
diagnóstica e construtiva). Ao contrário, na sala de aula, os educadores devem
se servir da avaliação e não dos exames escolares.
A clareza sobre esses fenômenos, e suas
respectivas compreensões, podem nos ajudar a praticar cada ato de modo adequado
a sua finalidade.
Cipriano Luckesi
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