sábado, 4 de outubro de 2014

51 - Avaliação da aprendizagem: duas compreensões diferentes, ainda que parecidas

Texto publicado anteriormente no Terra Blog, em 08 de maio de 2014
Cipriano Luckesi


Ótica classificatória e ótica diagnóstica.

O leitor poderá e deverá acessar o excelente artigo escrito por Sandra Maria Zákia Lian Souza, professora da Faculdade de Educação da USP, “Avaliação da aprendizagem na legislação nacional: dos anos 1930 aos dias atuais”. Está acessível em http://www.fcc.org.br/pesquisa/publicacoes/eae/arquivos/1536/1536.pdf.

Nesse texto, a professora nos revela a história das proposições — contidas nos textos da legislação nacional relativos à educação formal — sobre o acompanhamento da aprendizagem dos estudantes. Sem sombras de dúvidas deve ser lido. Excelente e cuidadosa abordagem.

A leitura do texto nos revela como o legislador educacional e, em consequência, como o educador escolar — professor, gestor escolar, autoridades educativas… —, genericamente falando, no tempo passado e no tempo presente, compreendem o acompanhamento da aprendizagem do educando sob a ótica exclusivamente classificatória.

Na trajetória histórica relatada, é possível identificar que, ao longo do período estudado, ainda que se tenha modificado os termos em uso e se tenha introduzido o conceito de “aproveitamento cumulativo ao longo do ano letivo”, supostamente diverso de “aproveitamento exclusivamente pontual” — no qual se leva em consideração com exclusividade o  resultado do momento pontual das provas —, a compreensão conceitual permanece a mesma, desde que, ao invés de um  único “momento pontual”, ter-se-á em consideração “uma média” de múltiplos momentos pontuais. Ou seja, mantém-se a compreensão classificatória dos exames escolares, que, conceitual e praticamente, é diversa da compreensão de avaliação.

O conceito de avaliação, tendo presente uma precisão terminológica, implica num olhar bem diferente sobre o significado classificatório dos exames escolares. Avaliação significa diagnóstico, prática diversa do conceito de classificação.

Na classificação, define-se uma posição fixa numa escala, previamente estabelecida, por exemplo, numa escala de 0 (zero) a 10 (dez) ou outra semelhante. No diagnóstico, contudo, configura-se a situação na qual a qualidade identificada de alguma coisa serve de base para o novo investimento no objeto da ação e sua consequente melhoria.

Tomo o exemplo do diagnóstico médico — mas, poderia ser um exemplo em qualquer outra profissão. Imaginemos um médico que, ao invés de diagnosticar o estado de saúde de seu cliente, classifique-o numa escala de graus de saúde. Com essa conduta, não teria como servir de mediador nos encaminhamentos para a melhoria da saúde de seu cliente. De forma semelhante, tome-se um engenheiro, um arquiteto ou um administrador — ou qualquer outro profissional — que, ao invés de diagnosticar a situação do seu objeto de ação, o classifique. O mesmo pode ocorre no cotidiano de cada uma de nós. Ao contrário, permanentemente, estamos diagnosticando tudo o que ocorre em nossa vida e ao seu redor, tendo em vista obter o melhor resultado.

Então, no caso da aprendizagem escolar, temos duas óticas: uma dos exames, que é classificatória, e a da avaliação, que é diagnóstica.

Essas duas óticas não podem ser confundidas sob pena de suprimirmos toda força que pode ter o ato avaliativo. O ato de examinar a aprendizagem na escola serve a uma intenção — classificatória, probatória e, por isso mesmo, estática — completamente diferente da intenção à qual serve a avaliação — diagnóstica, base de novas decisões construtivas, dinâmica.

A ótica classificatória está voltada para trás, para o passado, somente para o que já se fez e se conquistou. A avaliação, com base no passado, está voltada para o futuro; sob sua ótica, o que se conquistou serve de base para novas, melhores e mais significativas conquistas, em termos de qualidade dos resultados a serem obtidos.


A ótica diagnóstica, no que se refere à educação escolar, nos coloca na perspectiva da busca da qualidade plena da aprendizagem dos nossos educandos. Ela não nos permite contentarmos com o que temos, mas nos convida a investir sempre…, sempre no melhor. A ótica classificatória não olha para o futuro e para as possibilidades, por isso não exige nem nos convida, como também não nos subsidia bases para prosseguir em busca dos nossos desejos, com a melhor qualidade possível.






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