Texto publicado anteriormente no Terra Blog em Salvador, 27 de junho de 2013
Cipriano Luckesi
Quando em 2009, estabeleceu-se o
denominado de “Novo Enem”, cuja função, além de subsidiar a avaliação do Ensino
Médio no país (função que vinha desempenhando desde 1998), passou a ter também
a função de seleção para o ensino superior em todo o país, constituindo-se o
SISU – Sistema de Seleção Unificada.
Sabia-se perfeitamente, naquele
momento, que, com sua caraterística de abrangência nacional, o Enem teria a
possibilidade de garantir que todos os estudantes das mais variadas partes do
país tivessem acesso às vagas oferecidas em todos os estados da Federação.
Estava, então, estabelecida a possibilidade da mobilidade geográfica dos
estudantes ingressantes no nível superior de ensino. Essa possibilidade passou
a estar disponível em todas as instituições de ensino superior, que aderissem a
modalidade de seleção pelo SISU, mas, com certeza, de modo especial, nas
universidades públicas e gratuitas.
Sabia-se também que as já restritas
vagas oferecidas nas universidades federais, localizadas nas diversas regiões e
nos diversos estados, se tornariam mais disputadas com a concorrência de
estudantes originários de outras regiões e estados em relação aos estudantes da
região ou local onde estava instalada a instituição de ensino superior. O que,
possivelmente, diminuiria as chances de estudantes originários dos espaços
geográficos onde estavam instaladas as universidades de terem seu ingresso mais
viável nessas instituições.
Essa possibilidade de restrição das
vagas pela competividade seletiva ocorreria em função do fato da qualidade do
ensino nas escolas básicas sediadas nos estados mais desenvolvidos da Federação
apresentar-se com níveis mais satisfatórios. As escolas desses estados,
certamente, oferecem melhores condições de aprendizagem para os
seus estudantes, no que se refere aos conteúdos de caráter nacional ou, melhor
ainda, de caráter universal; conteúdos que compõem os instrumentos de coleta de
dados sobre desempenho dos estudantes no contexto das diversas avaliações de
larga escala implantadas no país, inclusive do ENEM, que seria ( eé) o
recurso seletivo .
Em dias recentes (estamos no final do
mês de junho do ano de 2013), a Universidade Federal da Bahia, através de seus
órgãos de administração superior, decidiu que o ingresso de novos estudantes em
seus cursos, a partir de agora, seria realizado através do SISU.
Então, imediatamente, surgiu a
conclusão, quase que espontânea, diante da possível restrição de vagas para os
candidatos locais: “Então, os estudantes de Salvador e da Bahia terão menos
vagas disponíveis para ingresso na UFBA em função do fato de que muitas de suas
vagas poderão ser ocupadas por estudantes provenientes de outras áreas do
país”.
A curto prazo, esse cenário é
ameaçador, podendo até mesmo estimular a emergência movimentos a favor da
proteção das vagas da universidade federal (ou de outras instituições públicas
de ensino superior) para estudantes originários dessa cidade e região.
Situação semelhante pode ocorrer em
qualquer outra região e quaisquer outros estados do país, onde as instituições
públicas tenham decidido adotar o SISU, como recurso de seleção dos novos
estudantes para os seus cursos de ensino superior. No contexto deste escrito, a
Universidade Federal da Bahia somente serve de expressão particular de um
fenômeno que tem possibilidade de se universal no país.
A médio e longo prazo, porém, o cenário da
possibilidade da mobilidade geográfica de estudantes ingressantes no ensino
superior pode ser extremamente benéfico para a educação básica no país. Diante
da possível restrição das vagas para estudantes locais, não haverá nenhuma
outra boa solução senão investir na qualidade do ensino e da aprendizagem em
nossas escolas.
Governantes, gestores de instituições
educacionais (de ensino fundamental e médio) e professores deverão tomar os
destinos de suas instituições em suas mãos para fazer delas escolas de alta
qualidade de ensino e de aprendizagem.
A meu ver, a lamentação dos fatos e o
possível protecionismo de vagas não será solução para nada. A solução virá de
um largo cuidado com nossas escolas, como instituição, e com nossos estudantes,
como seus usuários.
Então, todos terão condições de buscar
um lugar ao sol, em condições de igualdade no que se refere a uma capacitação
satisfatória, decorrente do bom ensino e da boa aprendizagem.
A equalização, no caso, não virá do
protecionismo, que, do ponto de vista da melhoria da competência (cognitiva,
científica, cultural, tecnológica, de relacionamento), não serve para muita
coisa; porém, ela virá sim da formação e da competência dos estudantes em
patamares mais satisfatórios. Nossos estudantes necessitarão de recursos para
buscar o seu lugar, com dignidade.
A meu ver, o cenário que se desenhava
em 2009 — e que agora está chegando aos mais variados espaços socioculturais do
país — traz uma mensagem fundamental para as autoridades educacionais (gestores
institucionais na área da educação) e educadores (no seio das escolas),
sinalizando-lhes a necessidade de investir mais, e mais, na qualidade do
ensino-aprendizagem.
Diante de um impasse, o que menos
permite resolvê-lo, de um lado, é a lamúria da dificuldade, e, do outro, o
protecionismo “contra” o que está emergindo. Contudo, o que é mais benéfico
para a situação, aqui registrada, ou para outros impasses, é o investimento
numa solução saudável.
O
cenário, aqui lembrado, nos convida a todos a investir na qualidade da
educação, propiciando aos nossos educandos condições de buscar o seu lugar ao
sol, não como um prêmio fácil, mas sim como resultado de uma construção sólida
de aprendizagens significativas.
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